
Homme de Papier
Oitavo romance de João Almino e segundo após entrar para a Academia Brasileira de Letras, Homem de papel transporta o conselheiro Aires para o século XXI. Livro será lançado em live no dia 12/04 às 19h.
O que Machado de Assis diria se escrevesse sobre a realidade contemporânea? Em Homem de papel, João Almino, diplomata e um dos escritores mais importantes da literatura nacional, resgata o personagem-narrador conselheiro Aires, transportando-o para os dias atuais. Se no machadiano Esaú e Jacó o conselheiro está numa trama sobre dois irmãos que disputam a mesma mulher e defendem regimes políticos contrários (Monarquia e República), em Homem de papel ele ganha protagonismo metamorfoseado em livro, do qual consegue dar escapadelas para o mundo real, regido pela ignorância e estupidez.
O exemplar que o abriga pertence à jovem diplomata Flor, trigêmea de Hugo e Miguel, que, assim como os gêmeos de Machado, estão em eterna rixa. O conselheiro se depara com as redes sociais e precisa se adaptar à velocidade com que as notícias se multiplicam. Diferentemente do final do século XIX e início do XX, cada notícia cria milhões e milhões de “verdades” de consequências irreparáveis.
Sobre Homem de papel, Hélio Guimarães, professor da USP, escreve: “Movendo-se entre a farsa, a paródia, a sátira e a tragicomédia, João Almino aciona com maestria muitas notas do cômico. O humor afasta qualquer sugestão de que o passado fosse muito melhor do que o presente. Continua valendo aqui, como em Machado, a convicção de que ciúmes, traições, medo, orgulho, vaidade até mudam de endereço, mas mantêm o frescor do primeiro pé de alface que nossos ancestrais arrancaram da terra.” E afirma o crítico português Abel Barros Baptista: “uma lição de literatura: surpreendente e inteligente.”
HOMEM DE PAPEL
João Almino
416 págs. | R$ 64,90
Ed. Record | Grupo Editorial Record
Informações à imprensa:
Simone Magno
simone.magno@record.com.br
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Lançamento
Homem de papel será lançado no dia 12 de abril, às 19h, em uma conversa do autor, João Almino, com o escritor Luiz Ruffato. A transmissão será ao vivo no youtube da Livraria da Travessa.
Trecho do livro
“Sempre que eu ouvia desavenças políticas, corriqueiras, menos corriqueiras e de todos os tipos, eu pensava em Pedro e Paulo, irmãos gêmeos, um monarquista e o outro republicano, que já brigavam na barriga da mãe. Vocês fiquem tranquilos, jamais darei tanta importância a eles neste meu relato. Não vou substituir suas paixões pelas dos partidos azul e vermelho, nem os colocar a defender e condenar o golpe, embora o tenham feito em 1889. Não os convidaria para estes papéis novos por uma razão fundamental: um e outro abdicariam, como fizeram no passado, de suas paixões políticas por outra maior. Escreveriam suas constituições pessoais, acima da Monarquia e da República, para conquistar o amor de uma moça que acabaria morrendo de indecisão.”
Sobre o autor
João Almino nasceu em Mossoró, RN. Diplomata e um dos nomes mais importantes da literatura nacional atualmente, tem sido aclamado pela crítica por seus romances Ideias para onde passar o fim do mundo (Prêmio do Instituto Nacional do Livro), Samba-enredo, As cinco estações do amor (Prêmio Casa de las Américas), O livro das emoções, Cidade livre (Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon), Enigmas da primavera e Entre facas, algodão. Seus romances foram publicados na Argentina, Espanha, EUA, França, Holanda, Itália e México, entre outros países. Seus escritos de história e filosofia política são referência para os estudiosos do autoritarismo e da democracia. Em 2017, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras.
Simone Magno
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CONSULTAR RESENHAS SOBRE « HOMEM DE PAPEL » abaixo e também em RESENHAS/Entre facas, algodão
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SOBRE « HOMEM DE PAPEL », LEIA ORELHA DO PROFESSOR HÉLIO GUIMARÃES, da Universidade de São Paulo:
O que diriam o conselheiro Aires, e Machado de Assis, sobre o estado de coisas no Brasil de hoje?
É essa a pergunta que parece mover a imaginação do escritor, e a do leitor, neste Seduções do Ocaso, o oitavo romance de João Almino.
O conselheiro Aires, que preside os dois últimos romances de Machado de Assis, é o narrador e protagonista aqui. Espiando de dentro das páginas do livro que habita há mais de século, e também em algumas escapadelas para o mundo exterior, ele passa em revista este nosso tempo regido pela ignorância e pela estupidez.
O exemplar que lhe serve de abrigo pertence a uma certa Flor, jovem diplomata, trigêmea de Hugo e Miguel. Neste caso, Flor não está dividida entre o amor de dois gêmeos, mas espremida entre dois irmãos em eterna rixa política.
O centro da ação desloca-se agora do Catete e do Botafogo para uma Brasília invadida por antas, esse animal tipicamente nacional, como o romance faz questão de frisar.
Os anos de transição da monarquia para a república, em que as personagens machadianas assistem, entre embasbacadas e indiferentes, tanto à abolição como à proclamação do novo regime, dão lugar à vertigem do agora.
A confusão generalizada não provoca muito mais do que bocejos no velho diplomata. Quando lhe perguntam como vê a atualidade, responde: “A lua está bonita”.
Aires, no entanto, não deixa de se espantar com a propaganda do Viagra, que lhe permitiria reescrever os velhos versos de Shelley e finalmente eliminar o “not” dos célebres versos “I can give not what men call love”.
Confrontado com as redes sociais, o conselheiro redivivo é obrigado a refazer as contas. Se no século 19 toda notícia crescia pelo menos de dois terços, agora cada notícia multiplica-se aos milhões, criando milhões e milhões de « verdades » em conflito.
Movendo-se entre a farsa, a paródia, a sátira e a tragicomédia, João Almino aciona com maestria muitas notas do cômico, provocando estampidos de riso, risadas malévolas, esgares e certamente muito sorriso amarelo.
O riso afasta qualquer sugestão de que o passado fosse muito melhor do que o presente. Continua valendo aqui, como em Machado, a convicção de que ciúmes, traições, medo, orgulho, vaidade até mudam de endereço, mas mantêm o frescor do primeiro pé de alface que nossos ancestrais arrancaram da Terra.
Assim, basta raspar de leve o tênue verniz que recobre as personagens para perceber que o mundo continua povoado pelos descendentes de Brás Cubas, Quincas Borba, Bento Santiago, Fidélia, dona Cesária e, claro, esse Aires, com a sua eterna flor na botoeira.
Neste que talvez seja o mais alusivo de todos os seus romances, João Almino não poupa ironia à vida literária, à academia, à política e à diplomacia. Entre o desespero e o riso, ressuscita o velho diplomata para nos perguntar ainda mais uma vez: « Que país é este? » E, por tabela, que mundo e que tempo é este em que sobrevivemos.
Hélio Guimarães, USP
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SOBRE « HOMEM DE PAPEL », LEIA POSFÁCIO DO PROFESSOR ABEL BARROS BAPTISTA, DA UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA:
“Olha, conselheiro… O senhor deve ficar no livro, é o que lhe digo. Nem Machado de Assis consegue permanecer como grande escritor sem a presença do senhor. Fique, conselheiro. O mundo lá fora, como está, não merece o senhor.” São palavras de uma certa D. Cesária, que o leitor vai encontrar bem cedo no livro que tem nas mãos. O mundo “lá fora” é o que vamos chamando de nosso, decerto aquele onde o mesmo leitor passa os seus dias; por oposição, lá dentro, o mundo é o do livro, e o livro é evidentemente Memorial de Aires. O problema do livro de João Almino fica assim posto por essa figura que já animava a obra de Machado com tanta maldade como graça: não tanto o problema de sair do livro, antes o de, saindo, ficar neste outro mundo, o que chamamos nosso. Nenhum mistério. De entrada se percebe que Aires está no livro e é o livro; e o livro, por sua vez, circula nesse nosso mundo, presente e próximo, pela mão de Flor, que tem no mesmo conselheiro Aires o seu interlocutor favorito. (Flor, não Flora, advertência em atenção aos machadianos assíduos.) Num certo sentido, o empreendimento ficcional de João Almino ajeita-se bem à formulação que descrevia D. Cesária: dá interesse a um reputado entediado e movimento a um confirmado defunto. Num primeiro movimento, a deslocação de Aires sugere que o romance o traz a este nosso mundo para o consertar, ao mundo, ou para que ele se conserte, o conselheiro. Quando o célebre verso de Shelley comparece — I can give not what men call love —, a sugestão é de algum intuito redescritivo, como se João Almino pretendesse, trazendo Aires ao nosso presente, restituir-lhe uma oportunidade de amor que negou a si mesmo no romance de Machado e, depois, uma oportunidade de empenho que lhe parecia negar a condição diplomática. A primeira possibilidade de Homem de Papel é assim a metaficcional; Aires narrando-se de novo, mas para se inventar novo. Entretanto, num lance surpreendente se compreende que Homem de Papel vai noutro sentido sem renunciar a esse primeiro. Ficar ou não ficar no mundo deste século, este mundo merecê-lo ou não, enquanto decisões e juízos atribuídos ao conselheiro Aires, emergem no confronto com a brutalidade desse “mundo lá fora” e abrem o caminho para uma alegoria delirante e sarcástica da actual conjuntura política brasileira, incompatível tanto com a diplomacia como com o tédio da controvérsia famosamente caracterizadores de Aires. O contraste é grande, e enorme a distância da delicadeza melancólica à boçalidade em que Aires fica tentado a morar para sempre. D. Cesária adverte que assim se prejudicaria a grandeza de Machado, que o mundo lá fora não merece o conselheiro: e eis a graça sem maldade nenhuma e a maldade sem graça nenhuma reunidas num só problema: ficar ou não ficar fora do livro. João Almino subverte Aires para o restituir ao original Aires de 1908: depois de ter transformado esse mesmo original em gerador de encontros e desencontros catalisados politicamente pelo aparecimento de uma anta. A discrepância entre os dois movimentos é suficientemente flagrante para operar uma lição de literatura: surpreendente e inteligente, remetendo ao passado sem perder a atração pelo presente, denunciando e do mesmo passo contemplando. E irónico, claro, divertidamente irónico, ou não fosse Aires o mais eminentemente personagem machadiano transportável para fora do livro e o mais eminentemente capaz de restaurar a necessidade de a ele regressar.
Abel Barros Baptista, Universidade Nova de Lisboa
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Sobre HOMEM DE PAPEL, leia resenha de Stefania Chiarelli em O Globo:
‘Homem de papel’: personagem de Machado de Assis conhece século XXI em novo livro de João Almino
Circulando as ruas de Brasília, o conselheiro Aires segue especialista na alma humana
Stefania Chiarelli, especial para O GLOBO
02/04/2022 – 04:30
Ele é um diplomata aposentado. Vestido à moda antiga, apresenta-se sóbrio, equilibrado, verdadeiro mediador. Homem bicentenário, seu nome é Aires, e ele vem de outro século — viajou diretamente das páginas de “Esaú e Jacó” (1904) e “Memorial de Aires” (1908), de Machado de Assis, para protagonizar “Homem de papel”, oitavo romance de João Almino. O escritor, nascido em Mossoró (RN), também diplomata, promove na narrativa intenso jogo entre passado e presente, em que o célebre personagem transita hoje pelas entrequadras de Brasília, no lugar dos passeios pela Praia de Botafogo e Rua do Ouvidor, no Centro da antiga capital federal.
Plantado neste confuso século XXI, Aires vai revelando, em primeira pessoa, sua perspectiva das coisas. O conselheiro agora mora dentro de um livro. A diplomata Flor, trigêmea de Hugo e Miguel, é sua interlocutora privilegiada, e diante de seus olhos espantados o personagem se materializa a cada tanto, saindo do exemplar para o mundo real. A moça vive uma crise, dividida entre o amor do marido Cássio e do colega Zeus, ecos visíveis da grande Flora, de “Esaú e Jacó”, jovem perdidamente apaixonada pelos gêmeos que protagonizam a trama.
É antiga a relação quase promíscua entre livros, histórias e palavras. A obra machadiana já vem marcada por múltiplas citações: o escritor carioca se pautou pela releitura da tradição, parodiando sem reservas o texto alheio, da Bíblia a José de Alencar, de Laurence Stern a Xavier de Maîstre. Nessa espiral, o romance de Almino se situa entre criação e apropriação, gesto que desde sempre sustenta a própria literatura. Ele não está só, muitos escritores já beberam dessa água, como Lygia Fagundes Telles, com o roteiro “Capitu” (1967), e Silviano Santiago, no romance “Machado” (2016), entre tantos outros.
Em Almino, ecoando Machado, Aires chama a atenção para que o leitor tome parte ativa na história, orientando nossa leitura com lembretes e perguntas: “Peço que não riam de mim” ou “Afinal, quem era eu?” Tal procedimento surge como alerta —estamos lendo um relato ficcional, aqui fala um homem de papel. Nessa condição, em algum momento ele dá o salto e sai da página escrita. Flor e a entusiasmada professora Leonor são as que melhor conseguem vê-lo.
Tentador ver aqui sopros vindos da cinematografia de Woody Allen, não por acaso diretor citado no discurso do escritor ao tomar posse na Academia Brasileira de Letras, para a qual foi eleito em 2017. “A rosa púrpura do Cairo” (1985) evoca com força a quebra da distância entre personagem fictício e espectadora, na figura de Tom Baxter, ator que abandona a tela para declarar o amor à garçonete Cecília, que vê o filme repetidas vezes na Nova Jersey dos anos 1930. Uma fã, um personagem. Uma leitora, um conselheiro. Em ambas as narrativas, a saída do protagonista provoca imediata desarmonia no universo ficcional. Como fazer sentido sem sua presença? Filme e livro respondem à pergunta com interessantes desdobramentos.
No âmbito da trama, chama a atenção a ambientação em Brasília, lugar de grande relevância na prosa de Almino, dedicada a pensar as relações com esse espaço mítico e utópico. À trilogia composta por “Ideias para onde passar o fim do mundo” (1987), “Samba-enredo” (1994) e “As cinco estações do amor” (2001), acresceu-se “O livro das emoções” (2008), “Cidade livre” (2010) e “Entre facas, algodão” (2017), também ancorados na cidade. Ao olhar para o conjunto dessa já vasta obra, é possível perceber um sólido projeto literário —temas e ambientação retornam, criando uma espécie de constelação em diálogo, em que o escritor dá asa solta à imaginação. Um personagem pode saltar das páginas do livro que o abriga, ou um computador é capaz de narrar toda a trama, como G.G., de “Samba-enredo”.
Mas o narrador Aires carrega várias ambiguidades. Empenhado em recordar o passado, confessa ter a memória falha, admitindo ser impreciso na recomposição do vivido. Surpresas e equívocos se intercalam, como na divertida passagem do carnaval, em que é tomado por folião. Nesse universo dúbio, por vezes um ser imaterial pode ser mais real do que indivíduos de carne e osso, e as cenas ambientadas no mundo da política e da diplomacia comprovam o quanto de teatro a vida obriga a fazer. Na visão de alguns, Aires revela prudência no viver. Já outros o enxergam como alguém que jamais se posiciona e evita a controvérsia a qualquer preço.
Mesmo desconhecendo as redes sociais, os aparelhos de celular e os bitcoins, o conselheiro segue um especialista na alma humana. No Brasil caótico de hoje, em que a diplomacia anda tão mal representada, seu espírito sensível e elegante faz diferença. Viúvo e sem filhos, Aires pensa que o verdadeiro patrimônio consiste na herança das palavras. Esse imprescindível capital constitui um modo de prolongar a estirpe do conselheiro nos leitores de hoje e do futuro — de corpo presente, papel ou dígitos, cada leitura dirá.
Stefania Chiarelli é professora e pesquisadora de literatura brasileira na UFF
« Homem de papel »
Autor: João Almino. Editora: Record. Páginas: 416.
https://oglobo.globo.com/cultura/livros/homem-de-papel-personagem-de-machado-de-assis-conhece-seculo-xxi-em-novo-livro-de-joao-almino-25459235
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Sobre HOMEM DE PAPEL leia resenha de Paula Sperb na revista Quatro Cinco Um:
Como se tornar moderno
Conselheiro Aires, famoso personagem de Machado de Assis, ganha roupagem atual em novo romance de João Almino
Paula Sperb
14mar2022 04h51 (14mar2022 10h05)

O escritor portiguar João AlminoPio Figueroa/Divulgação
Homem de papel
Em um primeiro momento, pode parecer uma missão delicada para um escritor apoderar-se de um personagem de Machado de Assis e trazê-lo para a atualidade em um romance. Tarefa desafiadora especialmente quando trata-se de Conselheiro Aires, personagem tão estimado pelos leitores machadianos. Parte do carisma de José da Costa Marcondes Aires — seu nome completo — deve-se principalmente ao caráter temperado e à capacidade de escutar e observar para, então, narrar os dramas humanos.
Aires, um diplomata aposentado, conta, em forma de diário, sua vida em 1888 e 1889, quando volta ao Brasil após passagem pela Europa, no seu Memorial de Aires (1908). Entretanto, os leitores já conheciam o personagem de Esaú e Jacó (1904), no qual se descobre que o romance é, na verdade, o décimo tomo do Memorial que o conselheiro estava escrevendo. Agora, Aires ganha fumos de modernidade em Homem de papel, oitavo romance de João Almino, o segundo desde que o escritor passou a integrar a Academia Brasileira de Letras (ABL), casa dos imortais fundada por Machado. Em Homem de papel, Aires é renovado, mas continua no papel de narrador.

Homem de papel, de João Almino
A forma como o leitor descobre quem narra já se encontra na primeira frase do romance: “Flor me colocava numa estante baixa entre uma cômoda de três gavetas e uma escrivaninha coberta de papéis desarrumados”. A oração inicial permite inferir de imediato que a voz está dentro de um livro na estante de Flor, uma das personagens. “Não quero valorizar essas minúcias, que não deveriam me ocupar quando me concentro na história principal. Se é que lhes conto uma história”, prossegue o narrador. Aqui, o Aires de Almino ressoa o Aires de Machado, que narra detalhes de seus compromissos e histórias para depois desculpar-se pelos seus supostos excessos em “minúcias”.
Almino — ele próprio um diplomata de carreira — conseguiu manter a coerência do personagem ao rejuvenescê-lo. Os leitores familiarizados com a voz de Aires e sua mentalidade. Como se tornar moderno Conselheiro Aires, famoso personagem de Machado de Assis, ganha roupagem atual em novo romance de João Almino Paula Sperb de aberta ao novo e sua convicção em não tomar partido de grandes questões não se decepcionarão. Na verdade, é quase um presente descobrir que é possível um Aires que usa “boné e óculos escuros” e caminha pelas ruas de Brasília, cidade que percorre parte significativa da obra de Almino. É lá que os ossos do conselheiro, doloridos devido ao reumatismo, param de doer. A cura não decorre da mudança de ares, do Rio de Janeiro para Brasília. O narrador explica e joga luz sobre o título da obra: “Passei a ter papel no lugar de ossos”.
Emancipação
Aires não apenas narra episódios vividos pela personagem Flor, a dona do livro, como também acompanha sua trajetória, de estudante à diplomata, passando a participar dela. Isso só é viável graças à emancipação do homem de papel, então preso ao livro. Esta emancipação ocorre em quatro etapas ao longo do romance. A primeira, quando Aires apenas escuta o que se passa ao seu redor, seja com o livro na estante ou fora dele. A segunda, quando Aires passa a escrever no livro, inserindo frases e até sinais de pontuação reconhecidos como novos por Flor. É adorável, porém não menos convincente, quando Aires deixa um emoji de sorriso para Flor, que enfrenta um momento de aflição. “Era como se eu tivesse me tornado moderno”, conta o narrador. A terceira etapa é quando Aires passa a falar de dentro do livro. Por fim, Aires sai do exemplar, inicialmente visível apenas para a dona da publicação.
A fusão de Machado de Assis com Jorge Amado faz com que ‘Homem de Papel’ seja o melhor livro de João Almino
Flor é uma mulher dividida entre o amor de Cássio e Zenir, desde a sua juventude. Seu dilema lembra aquele enfrentado pela personagem Flora, de Esaú e Jacó. Flora é objeto da paixão dos irmãos gêmeos Pedro e Paulo, opostos entre si inclusive politicamente. Enquanto um é monarquista, o outro é republicano. Flora também padece da indecisão entre os pretendentes. Mas a Flor de Almino não remete apenas a Machado de Assis, mas a Jorge Amado. Ela é um pouco Dona Flor e seus dois maridos (1966), como faz questão de apontar o personagem Zenir. Na saborosa obra amadiana, Flor é uma viúva que ama tanto o malandro Vadinho, o marido morto que aparece nu em forma de espírito, como o novo marido, o correto Teodoro.
Realismo mágico
Almino faz com que seja verossímil que Aires saia do livro e circule por Brasília. Há aí o traço de realismo mágico que também o aproxima de Jorge Amado. Não apenas há um diálogo com Dona Flor, como com O sumiço da santa (1988). No livro, uma imagem de Santa Bárbara, talhada por Aleijadinho, ganha vida ao desembarcar para ser exposta em um museu.
Além do elemento mágico, O sumiço da santa também é uma sátira política e trata de movimentos sociais e ditadura militar. Em Homem de papel, Almino não foge do contexto político. Os irmãos trigêmeos de Flor brigam por discordar sobre os rumos do país. Sabe-se que ocorreu um impeachment no Brasil e outro chega a ser cogitado. Em tom de fábula, antas — sim, os animais — invadem Brasília. Uma anta ganha fama e é aclamada para concorrer à Presidência. No Memorial de Aires, o contexto social e político é o do fim da escravidão e a proclamação da República.
A fusão de Machado de Assis com Jorge Amado somada à originalidade de um Aires rejuvenescido faz com que Homem de Papel seja o melhor livro de João Almino. O escritor não poupa delicadezas para os leitores, com referências de outras obras machadianas e do próprio Almino. O fotógrafo Cadu, personagem de Ideias para onde passar o fim do mundo (1987), romance de estreia de Almino, encontra com Aires. A mulher de Almino, a artista plástica Bia Wouk, também surge no livro, com um quadro que decora um ambiente. Diz-se que em Memorial de Aires Machado de Assis também teria colocado um pouco de sua biografia nos personagens Aguiar e D. Carmo, um casal sem filhos, assim como o autor e a mulher Carolina.
Logo no início de Memorial, Machado escreveu que a publicação estava “desbastada e estreita” e indicou: “O resto aparecerá um dia, se aparecer algum dia”. Graças ao poder da literatura de inventar uma nova realidade, é como se Almino tivesse dado continuidade ao Memorial.
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SOBRE « HOMEM DE PAPEL », LEIA MATÉRIA NO UOL ASSINADA POR RAFAELA BERTOLINI E ISABELLA BISORDI:
UOL:
VITRINE » CULTURA
UOL
ROMANCE RESGATA CONSELHEIRO AIRES, CLÁSSICO PERSONAGEM DE MACHADO DE ASSIS
« Homem de Papel » é o oitavo romance de João Almino, responsável por trazer Aires para o século XXI
RAFAELA BERTOLINI, SOB A SUPERVISÃO DE ISABELLA BISORDI PUBLICADO EM 02/03/2022, ÀS 15H35
Capa da obra « Homem de Papel » (2022) – Crédito: Reprodução / Record
Machado de Assis é um dos nomes mais importantes da literatura brasileira, sendo que seus livros e contos são celebrados até os dias atuais. E para resgatar uma parte da obra de Machado de Assis, o autor João Almino, também muito importante para a literatura brasileira, resgata o clássicopersonagem-narrador conselheiro Aires para transportá-lo ao século XXI.
« Homem de papel » tira o personagem do papel de conselheiro e o coloca como protagonista metamorfoseado na história, onde ele consegue escapar para o mundo real, que é regido pela ignorância e estupidez. A história conta sobre Flor, que é trigêmea de Hugo e Miguel. A relação entre os três é cercada de uma eterna richa política, assim como os gêmeos de Machado, Esaú e Jacó. Seria Flor a pessoa que atrapalha a simetria ou seria ela um epicentro de equilíbrio nessa disputa entre irmãos?
Crédito: Reprodução / Record
O livro se torna moderno por inserir Aires em um mundo moderno onde as notícias são muito rápidas e todos estão cercados por redes sociais. Assim, ele se torna responsável por trazer a essência de Machado de Assis para o mundo moderno, resgatando o seu humor sarcástico em uma narrativa intrigante e inteligente.
A obra será lançada pela editora Record no dia 14 de março de 2022, mas já está disponível para reserva na pré-venda na Amazon.
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Sobre HOMEM DE PAPEL, leia resenha de Vivian De Moraes, em Literatura Brasileira Contemporânea, QUORA.
JornalistaAtualizado 12 de abr.
[DICA DE LANÇAMENTO]
Homem de papel será lançado nesta terça, 12 de abril, às 19h, em uma conversa com o autor, João Almino, com o escritor Luiz Ruffato. A transmissão será ao vivo no Youtube da Livraria da Travessa.
[RESENHA]
O velhos Aires de Machado ressurge em
Homem de papel de João Almino (Record, 2022, 416 pp.)
O surrealismo predomina neste livro em que Almino, o autor imortal da ABL e diplomata, expõe questões de política e diplomacia de forma hilariante. O conselheiro Aires, personagem machadiana, que já foi Ayres, com « y », começa a se desprender do papel exatamente deixando-se escorregar nessa letrinha. Daí para a frente, ele vai ganhando mais autonomia, a partir da sua vida de papel. Ele é uma personagem de um livro editado por um tal M. de A., que nós sabemos bem quem é.
Em toda a trama, seja nas negociações políticas, seja no apaziguamento da família de Flor, a diplomata que possui o único exemplar da edição onde o conselheiro vive, ele se imiscui, por interesse e curiosidade pelos tempos atuais. Ele se envolve em discussões, tentando ser sempre neutro, mas sempre se confunde quando se fala de golpe, por exemplo (ele imagina que referem à proclamação da República), ou guerra (que ele acredita ser a do Paraguai). Novas formas de falar e tecnologias o confundem, e ele se veste à antiga, sem perder a elegância da postura e do discurso, quando resolve sair de vez do livro e fazer andanças que levam a comparações entre Brasília e o velho mar de Botafogo do Rio, antiga capital onde despachava.
As piruetas ocorrem sem parar neste enredo em que, por exemplo, ao se materializar fora do livro, tenta pagar comida ou outra coisa em vinténs, único dinheiro que possui, se envolve em protestos, sem intenção, e por isso vai parar na cadeia, se envolve amorosamente com uma mulher (Leonor) etc. Mas a graça maior vem na aparição, perto do fim do livro, de uma anta gigante em Brasília, onde o livro se passa, que políticos interesseiros propõem seja candidata à presidência da República. Ele é o único amigo real da anta. Este é um daqueles livros que despertam a pressa, a curiosidade irrefreável de se conhecer o fim da história.
AVALIAÇÃO: EXCELENTE
Leia um trecho do romance:
Sempre que eu ouvia desavenças políticas, corriqueiras, menos corriqueiras e de todos os tipos, eu pensava em Pedro e Paulo, irmãos gêmeos, um monarquista e o outro republicano, que já brigavam na barriga da mãe. Vocês fiquem tranquilos, jamais darei tanta importância a eles neste meu relato. Não vou substituir suas paixões pelas dos partidos azul e vermelho, nem os colocar a defender e condenar o golpe, embora o tenham feito em 1889. Não os convidaria para esses papéis novos por uma razão fundamental: um e outro abdicariam, como fizeram no passado, de suas paixões políticas por outra maior. Escreveriam suas constituições pessoais, acima da Monarquia e da República, para conquistar o amor de uma moça que acabaria morrendo de indecisão.
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Sobre HOMEM DE PAPEL, leia texto do escritor Antônio Torres:
João Almino nos brinda com o seu oitavo romance, com o qual acrescenta um ponto importante ao conjunto de sua obra – uma obra, diga-se, vigorosa e rigorosa, de intensa leveza narrativa, e que inclui o ensaio literário e escritos de história e filosofia.
Se no seu romance anterior, Entre facas, algodão, ele se fez o continuador da prosa realista, enxuta, metonímica de Graciliano Ramos, do mundo de casas repartidas dos meninos de engenho de José Lins do Rego, e até da poesia descarnada de João Cabral de Melo Neto, agora, com a pena da galhofa, tintas alegóricas, por vezes melancólicas, em outras utópicas e distópicas, João Almino resgata um personagem de Machado de Assis, e o enfia nas farsas e tragédias desse nosso tempo.
Homem de Papel tem como narrador o conselheiro Aires, que é transportado do Rio de Janeiro dos fins do século 19 e começos do 20 para a cidade projetada como um cenário modernista e que passa a ser associada ao que o país tem hoje como palco das mais acerbas e/ou retrógadas discussões, que, por óbvio, nem preciso nomear.
Se em Esaú e Jacó o conselheiro Aires está numa trama que envolve dois irmãos em disputa de uma mesma mulher, enquanto defendem regimes contrários (Monarquia e República), agora ele ganha protagonismo metamorfoseado em livro, do qual dá suas saídas para o mundo real – um mundo com as marcas da ignorância e da estupidez, bem visíveis nas quadras e ruas da capital federal.
O livro em que ele se abriga pertence à jovem diplomata Flor, trigêmea de Hugo e Miguel que, assim como os gêmeos de Machado de Assis, vivem em discórdia em razão de suas posições políticas.
Saturado de embates privados e públicos, restará ao conselheiro Aires o seguinte dilema: voltar ou não voltar para dentro do livro. E nisso João Almino opera uma lição de literatura, como assinala o ensaísta e crítico literário português Abel Barros Baptista, no posfácio de Homem de Papel, por ele considerado surpreendente, inteligente e “divertidamente irônico, ou não fosse Aires o mais eminentemente personagem machadiano transportável para fora do livro e o mais eminentemente capaz de restaurar a necessidade de a ele regressar”, conclui o muito premiado ensaísta e crítico literário Abel Barros Baptista, professor da Universidade Nova de Lisboa, e autor de 3 livros sobre Machado de Assis.
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Sobre HOMEM DE PAPEL, leia resenha de Adelto Gonçalves em Baía da Lusofonia, Lisboa, 9 de maio de 2022
Lisboa, segunda-feira, 9 de maio de 2022
‘Homem de papel’, uma metaficção machadiana
Oitavo romance de João Almino será fundamental para quem quiser saber, daqui a cem anos, o que foi o Brasil destes tempos
I
Foi quando já estava em seus derradeiros anos que Machado de Assis (1839-1908) escreveu o romance Memorial de Aires (1908) e que tem como personagem principal o conselheiro Aires, um diplomata em fim de carreira que já havia aparecido em Esaú e Jacó (1904) como participante do enredo, anotando em seu caderno tudo o que de mais significativo acontecia ao redor de sua vida. Esse personagem-narrador seria um alter ego do autor, como deixam concluir algumas coincidências, tais como a idolatria que dedica à mulher e a ausência de filhos em seu casamento.
Pois é esse personagem carismático que já não se sentia como “deste mundo”, pois se achava um homem do século XIX, que o premiado romancista João Almino ressuscita e transporta para o século XXI em sua última obra, Homem de papel (Editora Record, 2022), que, desta vez, alinha-se ao gênero da metaficção, ao romper com os cânones do Modernismo, mostrando-o como um autor pós-modernista. É o que se conclui da observação do professor Abel Barros Baptista, da Universidade Nova de Lisboa, feita no posfácio, ao ressaltar que “a primeira possibilidade de Homem de papel é assim a metaficcional”, com “Aires narrando-se de novo, mas para se inventar novo”.
Como se sabe, esse termo foi cunhado pelo romancista, contista, ensaísta e crítico literário norte-americano William Howard Gass (1924-2017), na década de 1960, para definir os romances que fugiam às convenções estabelecidas pelo Modernismo. Em Homem de papel, o personagem-narrador sai de Memorial de Aires para atuar no Brasil do século XXI, hoje um país à deriva num mar de ignorância e que parece ter perdido para sempre a batalha da Educação, como dizia João Calmon (1916-1999). E, assim, João Almino consegue construir “uma alegoria delirante e sarcástica da atual conjuntura política brasileira”, na definição perfeita de Abel Barros Baptista.
De fato, como observa no texto de apresentação o professor Hélio Guimarães, livre-docente de Literatura Brasileira da Universidade de São Paulo (USP), autor de vários livros sobre a obra de Machado de Assis, neste seu oitavo romance, João Almino “não poupa ironia à vida literária, à academia, à política e à diplomacia”. E, quando o conselheiro redivivo se refere a alguns personagens que povoam Homem de papel, não há como deixar de associá-los a algumas figuras que há anos dominam a cena política brasileira.
II
É de se lembrar que, em Esaú e Jacó, o conselheiro está envolvido como espectador de uma trama entre dois irmãos que têm ideais opostos, ou seja, um defende a monarquia enquanto o outro é adepto do regime republicano. Em seu retorno ao mundo dos homens, mais de um século depois, Aires, ao sair do exemplar que pertence à jovem diplomata Flor, depara-se com os irmãos Hugo e Miguel, igualmente defensores de ideias políticas opostas. Desta vez, não se trata de gêmeos, mas de trigêmeos, pois Flor teria nascido do mesmo parto que colocara seus irmãos no mundo. E procura atuar como o ponto de equilíbrio entre eles.
O que se destaca neste livro é a preocupação do autor em dar ao romance um viés pós-moderno, tratando de temas até há pouco tempo incomuns em romances, como o relacionamento entre as pessoas pelas chamadas redes sociais, que tornam a comunicação cada vez mais veloz, em que uma palavra mal colocada pode redundar em bloqueio e no fim de uma amizade.
Igualmente diplomata como o personagem Aires, João Almino conhece muito bem não só os meandros da política, que frequentemente obriga os profissionais do Itamaraty a agirem contra os seus princípios em nome da governabilidade e do bom entendimento entre as nações, como domina o cenário por onde transitam as personagens, ou seja, as agitadas superquadras ou a Praça dos Três Poderes em Brasília, em vez das pacatas Rua do Ouvidor e Praia de Botafogo, ao tempo de Machado de Assis.
Nesse sentido, João Almino assume-se como o escritor que faz de Brasília o pano de fundo predileto para as suas obras, tal como Machado de Assis fez do Rio de Janeiro do final do século XIX e início do XX, o que significa que, daqui a cem anos ou mais, sua obra, tal como a machadiana, será fundamental para quem quiser conhecer o Brasil destes tempos.
Ao mesmo tempo, é de se observar que, em sua metaficção machadiana, João Almino não deixa de exercer o humor à inglesa, ou a ironia, e ainda o humor cético, tal como Machado de Assis, construindo sátiras de fina textura. Como a da invasão de Brasília por uma legião de antas e da pretensão de uma delas de se candidatar à presidência da República.
Tal como a obra que lhe inspirou, João Almino faz de Homem de papel não propriamente um romance, nem mesmo uma novela que tenha escapado às rédeas do narrador, com suas quatrocentas e tantas páginas, mas um relato, um diário, enfim, um memorial ou um testamento literário de um tempo em que já não há espaço para ilusões.
III
Nascido em Mossoró, no Rio Grande do Norte, João Almino (1950), diplomata, é cônsul-geral do Brasil em Munique, na Alemanha. Foi embaixador em Quito, no Equador, por três anos e meio, de 2018 a 2022. Foi também cônsul em Lisboa. Fez doutoramento em Paris, sob a orientação do filósofo e historiador da Filosofia Claude Lefort (1924-2010), foi professor na Universidade Nacional Autônoma do México (Unam), na Universidade de Brasília (UnB), no Instituto Rio Branco e nas universidades de Berkeley, Stanford e Chicago, nos Estados Unidos. É membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) desde 2017.
Como romancista, é hoje reconhecido pela crítica como um dos nomes mais importantes da Literatura Brasileira, como comprovam os muitos prêmios que sua obra já recebeu. Seu penúltimo romance, Entre facas, algodão (Editora Record, 2018), com apresentação de Cristóvão Tezza e posfácio de Hans Ulrich Gumbrecht, obteve grande repercussão entre a mídia especializada.
O seu romance Ideias para onde passar o fim do mundo (1987) foi indicado ao Prêmio Jabuti e ganhou o Prêmio do Instituto Nacional do Livro (INL) e o Prêmio Candango de Literatura, enquanto As cinco estações do amor (2001) conquistou o Prêmio Casa de las Américas de 2003. Já O livro das emoções (2008) foi indicado ao 7º Prêmio Portugal Telecom e finalista do 6º Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de 2009.
Outro romance, Cidade livre (2010), foi vencedor do Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de melhor romance publicado no Brasil entre 2009 e 2011 e finalista do Prêmio Jabuti e do Prêmio Portugal Telecom de 2011, enquanto Enigmas da primavera (2015) ficou em segundo lugar no Prêmio Jabuti, como o melhor livro brasileiro traduzido, chegou a semifinalista do Prêmio Oceanos e foi finalista do Prêmio Rio de Literatura de 2016 e segundo colocado do Prêmio São Paulo de Literatura de 2016, como livro brasileiro publicado no exterior, com tradução para o inglês. É autor também do romance Samba-enredo (1994). Alguns de seus romances foram publicados na Argentina, Espanha, Estados Unidos, França, Itália, México e em outros países.
Seus livros de História e Filosofia Política são referências para os estudiosos do autoritarismo e da democracia. Entre estes, estão Os democratas autoritários (1980), A idade do presente (1985), Era uma vez uma Constituinte (1985) e O segredo e a informação (1986). É também autor de Naturezas mortas – a filosofia política do ecologismo (2004), de Brasil-EUA: balanço poético (1996), Escrita em contraponto (2008), O diabrete angélico e o pavão: enredo e amor possíveis em Brás Cubas (2009), 500 anos de Utopia (2017) e Dois ensaios sobre Utopia (2017).
Publicou ainda Literatura Brasileira e Portuguesa ano 2000, organizado com o professor Arnaldo Saraiva, da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e Rio Branco, a América do Sul e modernização do Brasil (2002), organizado com Carlos Henrique Cardim, diplomata e professor universitário, docente do Instituto Rio Branco e da UnB. Adelto Gonçalves – Brasil
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Homem de papel, de João Almino, com apresentação de Hélio Guimarães, professor da Universidade de São Paulo (USP) e posfácio de Abel Barros Baptista, professor da Universidade Nova de Lisboa. Rio de Janeiro: Editora Record, 416 páginas, R$ 64,90, 2022. E-mail: sac@record.com.br Site: www.record.com.br
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Adelto Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/Academia Brasileira de Letras, 2012), Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015) e Os Vira-latas da Madrugada (Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981; Taubaté-SP, Letra Selvagem, 2015), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br
https://baiadalusofonia.blogspot.com/2022/05/homem-de-papel-uma-metaficcao-machadiana.html?fbclid=IwAR3xSAYf_zT_lpOJQ4K7Wo4whxTZi8AHzyO_6bUsYw9qPigrmBqwfoCks2U
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