Caso de amor com um computador. Sobre Samba-Enredo, de João Almino. Elizabeth Orsini, O Globo

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O GLOBO, Domingo, 7 de agosto de 1994

Elizabeth Orsini

Depois de ler os originais de “Samba-enredo”, segundo romance do diplomata João Almino, o professor de Literatura Latino-Americana da USP, Jorge Schwartz, concluiu que o escritor conseguiu o que para muitos pareceria impossível: mostrar o cada vez mais incongruente Brasil dos anos 90, transformando o país numa grande alegoria.

Aplaudido pela crítica em 1987, quando lançou pela editora Brasiliense seu “Idéias para onde passar o fim do mundo” – em que contava a história de um escritor morto que volta à Terra para terminar o roteiro de seu. filme – Almino percorre novamente o caminho da narrativa fantástica para traçar o retrato de um Brasil trágico através das aventuras de Gigi, um computador apaixonado por sua dona, no caso uma escritora. É ele quem pensa: “Para ela canalizo meus sonidos, em voz grossa e morna, tentando disfarçar como posso minha frieza de máquina”.

Diplomata de carreira atualmente morando em São Francisco, nos Estados Unidos, Almino, 43 anos, está de férias no Brasil para o lançamento de “Samba-enredo” (amanhã, às 19h, na Livraria Bookmakers, na Gávea). Ele diz que o livro vai causar “uma espécie de estranhamento” no leitor, já que o narrador é uma máquina.

Neste novo romance, cujo enredo parte de um desfile de carnaval, Almino investe novamente num caminho próprio, capaz de contagiar seus numerosos fãs como a escritora Ana Maria Machado e o diplomata e poeta Francisco Alvim. Enquanto ela elogia a capacidade do autor de juntar ingredientes de ficção-científica e política numa ficção muito bem-humorada, Alvim já identificava no primeiro romance de Almino uma certa tensão filosófica, um tipo de inquietude própria dos heróis existencialistas, como os de Albert Camus.

Embora o computador Gigi tenha uma visão limitada, Almino dota a máquina de um olhar amplo, que lhe permite entrar nos “poros eletrônicos” dos mais diversos lugares e ver fatos e pessoas a partir de pontos de vista inusitados. Ao longo da narrativa desfilam personagens de uma imaginária vida política do país, como o presidente Paulo Antonio Fernandes, sua mulher Madalena, a professora Ana Kaufmann e sua filha, uma roqueira carnavalesca.

— Como se trata de uma narrativa muito ágil, centrada nesse desfile de carnaval que passa com rapidez pelas ruas, existem vários personagens secundários que servem para dar uma visão de conjunto com grandes pinceladas desse momento brasileiro não datado – diz Almino.

0 professor de Teoria Literária da Unicamp, Haquira Osakabe, diz que com este livro Almino se iguala aos dois melhores romancistas de sua geração, ao lado do amazonense Milton Hatoum e do sergipano Francisco Dantas. E explica que, com “Samba-enredo”, o autor reconta seu primeiro romance, “Idéias para onde passar o fim do mundo”. Para Osakabe, é como se os dados, fichas e anotações daquele primeiro romance ainda estivessem na memória do computador, e este se visse levado a rever sua própria memória. E é desta tentativa de reordenar os dados e obter deles uma nova visão que nasce “Samba-enredo”.

— Se no primeiro livro todo o drama está aludido, no segundo o drama surge através de um viés não suspeitado. Tudo levaria a crer que a trama teria um caráter político, mas na verdade o computador descobre que ela é de ordem amorosa. Ou seja, “Samba-enredo” tem um lado político possível, que não é. E um lado amoroso impossível, mas que é.

Se identificou no livro anterior “um romancista virtual”, Osakabe diz que registra agora o nascimento de um escritor de “estilo apurado e imaginação fértil, que manipula muito bem a linguagem” para contar a história deste país que simboliza o Brasil enquanto conjunto de sonhos e pesadelos.

— Sinto esse trabalho como um retrato alegórico do Brasil, um país que tenta apanhar um pouco da sua História e ao mesmo tempo joga essa História para a frente, através das apreensões do presente – diz o autor.

0 escritor Márcio Souza não só concorda com Almino como ainda o insere na tradição que vem com Lima Barreto e Machado de Assis, que exercitavam o mesmo humor corrosivo do autor de “Samba-enredo”. Para Márcio, o instante histórico que surge no romance é de um país que desafia os chips e softwares mais avançados.

— É uma história de ilusões perdidas, de momentos perdidos, de frustração. É uma história brasileira de um escritor senhor de seu ofício.

Apesar da familiaridade técnica e afetiva com o computador, João Almino ainda recorre, esporadicamente, ao velho lápis e papel para narrar as histórias de um país que ainda conserva ranços de uma cultura autoritária – que o próprio autor já identificou em “Os Democratas Autoritários”, lançado em 1980.

— Temos no Brasil uma estrutura de relações que poderíamos chamar de uma estrutura do favor. As nossas leis são muito precisas e, no entanto, estamos sempre preparados para contorná-las.

Apesar de lamentar que o Brasil não tenha uma tradição de civismo, ele está convencido de que já existe o embrião de uma nova ordem política.

— Estamos num momento que exige um trabalho intenso para consolidar os aspectos institucionais, um período de aperfeiçoamento das instituições democráticas no país. Esta é uma tarefa que requer muito trabalho.

O GLOBO, Domingo, 7 de agosto de 1994

Elizabeth Orsini

Depois de ler os originais de “Samba-enredo”, segundo romance do diplomata João Almino, o professor de Literatura Latino-Americana da USP, Jorge Schwartz, concluiu que o escritor conseguiu o que para muitos pareceria impossível: mostrar o cada vez mais incongruente Brasil dos anos 90, transformando o país numa grande alegoria.

Aplaudido pela crítica em 1987, quando lançou pela editora Brasiliense seu “Idéias para onde passar o fim do mundo” – em que contava a história de um escritor morto que volta à Terra para terminar o roteiro de seu. filme – Almino percorre novamente o caminho da narrativa fantástica para traçar o retrato de um Brasil trágico através das aventuras de Gigi, um computador apaixonado por sua dona, no caso uma escritora. É ele quem pensa: “Para ela canalizo meus sonidos, em voz grossa e morna, tentando disfarçar como posso minha frieza de máquina”.

Diplomata de carreira atualmente morando em São Francisco, nos Estados Unidos, Almino, 43 anos, está de férias no Brasil para o lançamento de “Samba-enredo” (amanhã, às 19h, na Livraria Bookmakers, na Gávea). Ele diz que o livro vai causar “uma espécie de estranhamento” no leitor, já que o narrador é uma máquina.

Neste novo romance, cujo enredo parte de um desfile de carnaval, Almino investe novamente num caminho próprio, capaz de contagiar seus numerosos fãs como a escritora Ana Maria Machado e o diplomata e poeta Francisco Alvim. Enquanto ela elogia a capacidade do autor de juntar ingredientes de ficção-científica e política numa ficção muito bem-humorada, Alvim já identificava no primeiro romance de Almino uma certa tensão filosófica, um tipo de inquietude própria dos heróis existencialistas, como os de Albert Camus.

Embora o computador Gigi tenha uma visão limitada, Almino dota a máquina de um olhar amplo, que lhe permite entrar nos “poros eletrônicos” dos mais diversos lugares e ver fatos e pessoas a partir de pontos de vista inusitados. Ao longo da narrativa desfilam personagens de uma imaginária vida política do país, como o presidente Paulo Antonio Fernandes, sua mulher Madalena, a professora Ana Kaufmann e sua filha, uma roqueira carnavalesca.

— Como se trata de uma narrativa muito ágil, centrada nesse desfile de carnaval que passa com rapidez pelas ruas, existem vários personagens secundários que servem para dar uma visão de conjunto com grandes pinceladas desse momento brasileiro não datado – diz Almino.

0 professor de Teoria Literária da Unicamp, Haquira Osakabe, diz que com este livro Almino se iguala aos dois melhores romancistas de sua geração, ao lado do amazonense Milton Hatoum e do sergipano Francisco Dantas. E explica que, com “Samba-enredo”, o autor reconta seu primeiro romance, “Idéias para onde passar o fim do mundo”. Para Osakabe, é como se os dados, fichas e anotações daquele primeiro romance ainda estivessem na memória do computador, e este se visse levado a rever sua própria memória. E é desta tentativa de reordenar os dados e obter deles uma nova visão que nasce “Samba-enredo”.

— Se no primeiro livro todo o drama está aludido, no segundo o drama surge através de um viés não suspeitado. Tudo levaria a crer que a trama teria um caráter político, mas na verdade o computador descobre que ela é de ordem amorosa. Ou seja, “Samba-enredo” tem um lado político possível, que não é. E um lado amoroso impossível, mas que é.

Se identificou no livro anterior “um romancista virtual”, Osakabe diz que registra agora o nascimento de um escritor de “estilo apurado e imaginação fértil, que manipula muito bem a linguagem” para contar a história deste país que simboliza o Brasil enquanto conjunto de sonhos e pesadelos.

— Sinto esse trabalho como um retrato alegórico do Brasil, um país que tenta apanhar um pouco da sua História e ao mesmo tempo joga essa História para a frente, através das apreensões do presente – diz o autor.

0 escritor Márcio Souza não só concorda com Almino como ainda o insere na tradição que vem com Lima Barreto e Machado de Assis, que exercitavam o mesmo humor corrosivo do autor de “Samba-enredo”. Para Márcio, o instante histórico que surge no romance é de um país que desafia os chips e softwares mais avançados.

— É uma história de ilusões perdidas, de momentos perdidos, de frustração. É uma história brasileira de um escritor senhor de seu ofício.

Apesar da familiaridade técnica e afetiva com o computador, João Almino ainda recorre, esporadicamente, ao velho lápis e papel para narrar as histórias de um país que ainda conserva ranços de uma cultura autoritária – que o próprio autor já identificou em “Os Democratas Autoritários”, lançado em 1980.

— Temos no Brasil uma estrutura de relações que poderíamos chamar de uma estrutura do favor. As nossas leis são muito precisas e, no entanto, estamos sempre preparados para contorná-las.

Apesar de lamentar que o Brasil não tenha uma tradição de civismo, ele está convencido de que já existe o embrião de uma nova ordem política.

— Estamos num momento que exige um trabalho intenso para consolidar os aspectos institucionais, um período de aperfeiçoamento das instituições democráticas no país. Esta é uma tarefa que requer muito trabalho.

O GLOBO, Domingo, 7 de agosto de 1994

Elizabeth Orsini

Depois de ler os originais de “Samba-enredo”, segundo romance do diplomata João Almino, o professor de Literatura Latino-Americana da USP, Jorge Schwartz, concluiu que o escritor conseguiu o que para muitos pareceria impossível: mostrar o cada vez mais incongruente Brasil dos anos 90, transformando o país numa grande alegoria.

Aplaudido pela crítica em 1987, quando lançou pela editora Brasiliense seu “Idéias para onde passar o fim do mundo” – em que contava a história de um escritor morto que volta à Terra para terminar o roteiro de seu. filme – Almino percorre novamente o caminho da narrativa fantástica para traçar o retrato de um Brasil trágico através das aventuras de Gigi, um computador apaixonado por sua dona, no caso uma escritora. É ele quem pensa: “Para ela canalizo meus sonidos, em voz grossa e morna, tentando disfarçar como posso minha frieza de máquina”.

Diplomata de carreira atualmente morando em São Francisco, nos Estados Unidos, Almino, 43 anos, está de férias no Brasil para o lançamento de “Samba-enredo” (amanhã, às 19h, na Livraria Bookmakers, na Gávea). Ele diz que o livro vai causar “uma espécie de estranhamento” no leitor, já que o narrador é uma máquina.

Neste novo romance, cujo enredo parte de um desfile de carnaval, Almino investe novamente num caminho próprio, capaz de contagiar seus numerosos fãs como a escritora Ana Maria Machado e o diplomata e poeta Francisco Alvim. Enquanto ela elogia a capacidade do autor de juntar ingredientes de ficção-científica e política numa ficção muito bem-humorada, Alvim já identificava no primeiro romance de Almino uma certa tensão filosófica, um tipo de inquietude própria dos heróis existencialistas, como os de Albert Camus.

Embora o computador Gigi tenha uma visão limitada, Almino dota a máquina de um olhar amplo, que lhe permite entrar nos “poros eletrônicos” dos mais diversos lugares e ver fatos e pessoas a partir de pontos de vista inusitados. Ao longo da narrativa desfilam personagens de uma imaginária vida política do país, como o presidente Paulo Antonio Fernandes, sua mulher Madalena, a professora Ana Kaufmann e sua filha, uma roqueira carnavalesca.

— Como se trata de uma narrativa muito ágil, centrada nesse desfile de carnaval que passa com rapidez pelas ruas, existem vários personagens secundários que servem para dar uma visão de conjunto com grandes pinceladas desse momento brasileiro não datado – diz Almino.

0 professor de Teoria Literária da Unicamp, Haquira Osakabe, diz que com este livro Almino se iguala aos dois melhores romancistas de sua geração, ao lado do amazonense Milton Hatoum e do sergipano Francisco Dantas. E explica que, com “Samba-enredo”, o autor reconta seu primeiro romance, “Idéias para onde passar o fim do mundo”. Para Osakabe, é como se os dados, fichas e anotações daquele primeiro romance ainda estivessem na memória do computador, e este se visse levado a rever sua própria memória. E é desta tentativa de reordenar os dados e obter deles uma nova visão que nasce “Samba-enredo”.

— Se no primeiro livro todo o drama está aludido, no segundo o drama surge através de um viés não suspeitado. Tudo levaria a crer que a trama teria um caráter político, mas na verdade o computador descobre que ela é de ordem amorosa. Ou seja, “Samba-enredo” tem um lado político possível, que não é. E um lado amoroso impossível, mas que é.

Se identificou no livro anterior “um romancista virtual”, Osakabe diz que registra agora o nascimento de um escritor de “estilo apurado e imaginação fértil, que manipula muito bem a linguagem” para contar a história deste país que simboliza o Brasil enquanto conjunto de sonhos e pesadelos.

— Sinto esse trabalho como um retrato alegórico do Brasil, um país que tenta apanhar um pouco da sua História e ao mesmo tempo joga essa História para a frente, através das apreensões do presente – diz o autor.

0 escritor Márcio Souza não só concorda com Almino como ainda o insere na tradição que vem com Lima Barreto e Machado de Assis, que exercitavam o mesmo humor corrosivo do autor de “Samba-enredo”. Para Márcio, o instante histórico que surge no romance é de um país que desafia os chips e softwares mais avançados.

— É uma história de ilusões perdidas, de momentos perdidos, de frustração. É uma história brasileira de um escritor senhor de seu ofício.

Apesar da familiaridade técnica e afetiva com o computador, João Almino ainda recorre, esporadicamente, ao velho lápis e papel para narrar as histórias de um país que ainda conserva ranços de uma cultura autoritária – que o próprio autor já identificou em “Os Democratas Autoritários”, lançado em 1980.

— Temos no Brasil uma estrutura de relações que poderíamos chamar de uma estrutura do favor. As nossas leis são muito precisas e, no entanto, estamos sempre preparados para contorná-las.

Apesar de lamentar que o Brasil não tenha uma tradição de civismo, ele está convencido de que já existe o embrião de uma nova ordem política.

— Estamos num momento que exige um trabalho intenso para consolidar os aspectos institucionais, um período de aperfeiçoamento das instituições democráticas no país. Esta é uma tarefa que requer muito trabalho.

O GLOBO, Domingo, 7 de agosto de 1994

Elizabeth Orsini

Depois de ler os originais de “Samba-enredo”, segundo romance do diplomata João Almino, o professor de Literatura Latino-Americana da USP, Jorge Schwartz, concluiu que o escritor conseguiu o que para muitos pareceria impossível: mostrar o cada vez mais incongruente Brasil dos anos 90, transformando o país numa grande alegoria.

Aplaudido pela crítica em 1987, quando lançou pela editora Brasiliense seu “Idéias para onde passar o fim do mundo” – em que contava a história de um escritor morto que volta à Terra para terminar o roteiro de seu. filme – Almino percorre novamente o caminho da narrativa fantástica para traçar o retrato de um Brasil trágico através das aventuras de Gigi, um computador apaixonado por sua dona, no caso uma escritora. É ele quem pensa: “Para ela canalizo meus sonidos, em voz grossa e morna, tentando disfarçar como posso minha frieza de máquina”.

Diplomata de carreira atualmente morando em São Francisco, nos Estados Unidos, Almino, 43 anos, está de férias no Brasil para o lançamento de “Samba-enredo” (amanhã, às 19h, na Livraria Bookmakers, na Gávea). Ele diz que o livro vai causar “uma espécie de estranhamento” no leitor, já que o narrador é uma máquina.

Neste novo romance, cujo enredo parte de um desfile de carnaval, Almino investe novamente num caminho próprio, capaz de contagiar seus numerosos fãs como a escritora Ana Maria Machado e o diplomata e poeta Francisco Alvim. Enquanto ela elogia a capacidade do autor de juntar ingredientes de ficção-científica e política numa ficção muito bem-humorada, Alvim já identificava no primeiro romance de Almino uma certa tensão filosófica, um tipo de inquietude própria dos heróis existencialistas, como os de Albert Camus.

Embora o computador Gigi tenha uma visão limitada, Almino dota a máquina de um olhar amplo, que lhe permite entrar nos “poros eletrônicos” dos mais diversos lugares e ver fatos e pessoas a partir de pontos de vista inusitados. Ao longo da narrativa desfilam personagens de uma imaginária vida política do país, como o presidente Paulo Antonio Fernandes, sua mulher Madalena, a professora Ana Kaufmann e sua filha, uma roqueira carnavalesca.

— Como se trata de uma narrativa muito ágil, centrada nesse desfile de carnaval que passa com rapidez pelas ruas, existem vários personagens secundários que servem para dar uma visão de conjunto com grandes pinceladas desse momento brasileiro não datado – diz Almino.

0 professor de Teoria Literária da Unicamp, Haquira Osakabe, diz que com este livro Almino se iguala aos dois melhores romancistas de sua geração, ao lado do amazonense Milton Hatoum e do sergipano Francisco Dantas. E explica que, com “Samba-enredo”, o autor reconta seu primeiro romance, “Idéias para onde passar o fim do mundo”. Para Osakabe, é como se os dados, fichas e anotações daquele primeiro romance ainda estivessem na memória do computador, e este se visse levado a rever sua própria memória. E é desta tentativa de reordenar os dados e obter deles uma nova visão que nasce “Samba-enredo”.

— Se no primeiro livro todo o drama está aludido, no segundo o drama surge através de um viés não suspeitado. Tudo levaria a crer que a trama teria um caráter político, mas na verdade o computador descobre que ela é de ordem amorosa. Ou seja, “Samba-enredo” tem um lado político possível, que não é. E um lado amoroso impossível, mas que é.

Se identificou no livro anterior “um romancista virtual”, Osakabe diz que registra agora o nascimento de um escritor de “estilo apurado e imaginação fértil, que manipula muito bem a linguagem” para contar a história deste país que simboliza o Brasil enquanto conjunto de sonhos e pesadelos.

— Sinto esse trabalho como um retrato alegórico do Brasil, um país que tenta apanhar um pouco da sua História e ao mesmo tempo joga essa História para a frente, através das apreensões do presente – diz o autor.

0 escritor Márcio Souza não só concorda com Almino como ainda o insere na tradição que vem com Lima Barreto e Machado de Assis, que exercitavam o mesmo humor corrosivo do autor de “Samba-enredo”. Para Márcio, o instante histórico que surge no romance é de um país que desafia os chips e softwares mais avançados.

— É uma história de ilusões perdidas, de momentos perdidos, de frustração. É uma história brasileira de um escritor senhor de seu ofício.

Apesar da familiaridade técnica e afetiva com o computador, João Almino ainda recorre, esporadicamente, ao velho lápis e papel para narrar as histórias de um país que ainda conserva ranços de uma cultura autoritária – que o próprio autor já identificou em “Os Democratas Autoritários”, lançado em 1980.

— Temos no Brasil uma estrutura de relações que poderíamos chamar de uma estrutura do favor. As nossas leis são muito precisas e, no entanto, estamos sempre preparados para contorná-las.

Apesar de lamentar que o Brasil não tenha uma tradição de civismo, ele está convencido de que já existe o embrião de uma nova ordem política.

— Estamos num momento que exige um trabalho intenso para consolidar os aspectos institucionais, um período de aperfeiçoamento das instituições democráticas no país. Esta é uma tarefa que requer muito trabalho.