Nenhuma Brasília existe – a cidade na ficção livre de João Almino. João Cezar de Castro Rocha, Philia&Filia

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Philia&Filia, Porto Alegre, vol. 01, n° 1, jan./jun. 2010

SSN 2178-1737

Nenhuma Brasília existe – a cidade na ficção livre de João Almino

 

João Cezar de Castro Rocha[1]

 

O título deste artigo aproveita a formulação de personagem de Cidade livre, o engenheiro Roberto Gonçalves. Em sua definição de Brasília, “Essa cidade é para ser uma cidade moderna, aberta ao mundo, não precisa ser pitoresca”. Desse modo, o engenheiro, orgulhoso do projeto de Lucio Costa e Oscar Niemeyer, respondia à objeção de Matilde, uma das tias do personagem-narrador, João, ou JA como ele assina a “introdução” do romance, ocultando assim seu nome completo.[2] Na crítica aberta de Matilde: “Não há nada de pitoresco neste lugar; se pelo menos houvesse umas montanhas…”. [3]

Essa suave discussão entre os dois personagens tanto sugere a tensão erótica que principia a se desenvolver entre eles quanto constitui um dos eixos centrais da estrutura ficcional de Cidade livre. Talvez dos cinco romances dedicados à cidade de Brasília, esse seja o que mais revela o ideário estético-literário do autor de Ideias onde passar o fim do mundo.

Aliás, uma vez mais, aproveito formulação de João Almino – esse outro JA. Em ensaio fundamental para a compreensão de sua arquitetura ficcional, o leitor encontra a seguinte reflexão: “Esta cidade sem raízes, povoada de migrantes, onde a identidade é aberta e múltipla, recusa a noção de origem única. Aqui as origens podem aparentar o que são de fato: mitos ou referências cambiantes. A cidade serve de vacina contra o pitoresco”.[4]

Compreenda-se bem o ponto: a recusa do pitoresco permite transformar a proposta teórica do ensaísta do “universalismo descentrado” no autêntico plano piloto do projeto literário do escritor. Ora, se o “universalismo descentrado” pretende “liberar a criação para que ela não fique presa a modas internacionais e nem mesmo a fronteiras ou raízes”,[5] então, localizar sua ficção obsessivamente em Brasília, com passagem eventual pelo Rio de Janeiro em O livro das emoções, tanto significa precisão geográfica quanto necessidade poética. É como se Brasília oferecesse o meridiano mais adequado para uma literatura cujo lugar desde sempre convidasse ao cruzamento complexo de imaginação e geometria, ficção e realidade, misticismo e racionalidade, na mistura improvável, mas muito instigante, de Lucio Costa e Dom Bosco, Oscar Niemeyer e Tia Neiva, Plano Piloto e Vale do Amanhecer.

Aliás, a divergência de Matilde e Roberto entre Brasília e Rio de Janeiro talvez se relacione com um aspecto importante do projeto estético de João Almino.

Assim, se não me equivoco, Brasília, para João Almino, menos do que território físico, localizado no Planalto Central, é uma “floresta de símbolos”, para recordar o célebre verso de Baudelaire. Ou seja, as contradições e paradoxos inerentes ao plano piloto fornecem matéria-prima ficcional de primeira ordem. Creio que posso esclarecer essa idéia recordando um poema de João Cabral de Melo Neto:

 

Enquanto com Max Bense eu ia

como que sua filosofia

mineral, toda esquadrias

do metal-luz dos meios-dias,

arquitetura se fazia:

mais um edifício sem entropia,

literalmente, se construía:

um edifício filosofia.

 

Enquanto Max Bense a visita

e a vai dizendo, Brasília,

eu também de visita ia:

ao edifício do que ele dizia;

edifício que, todavia,

de duas formas existia:

na de edifício em que se habita

e de edifício que nos habita.[6]

 

Afinal, ainda nas palavras do engenheiro Roberto, “engenharia é prosa, mas arquitetura é pura poesia”.[7] E, como se sabe, Max Bense visitou o Brasil diversas vezes, dedicando-se especialmente a compreender o sentido de Brasília para a civilização brasileira e para o mundo como um todo, esforço reflexivo que evoca o método do autor de Samba enredo. Gostaria, portanto, de propor um diálogo entre o “universalismo descentrado” de Almino e a forma como Bense definiu a “inteligência brasileira”. Em suas palavras: “A inteligência cartesiana é a decisão pela clareza consciente a despeito de se ter à disposição a terna obscuridade. Mas, por inteligência brasileira, entendo o desenvolvimento da clareza espiritual do país na direção de uma produtividade e de uma esperança autoconfiante naquilo que diz respeito ao método e ao estilo, à alegria e à melancolia”.[8]

Curiosamente essa é uma passagem muito pouco cartesiana que não deixa de evocar os devaneios espirituais da prostituta Lucrécia, isto é, da personagem que comparece nos cinco romances de João Almino, a líder espiritual Irís Quelemén, idolatrada no Jardim da Salvação. No fundo, o projeto de Irís-Lucrécia possui uma racionalidade impecável, representando o paroxismo da própria ideia de hibridismo cultural. Senão vejamos, “a Fraternidade Eclética Espiritualista Universal” profetizava a criação lógica da “Cidade Eclética [que] deve ser a Nova Jerusalém”; nessa cidade, a religião dominante seria logicamente eclética: “Não é uma religião, é uma mistura do que há de melhor nas religiões, para que haja a concórdia universal entre elas”.[9] Ao que tudo indica, a raça cósmica de José Vasconcelos encontrou sua religião e a racionalidade de Simão Bacamarte sua residência na terra, pois a profetisa de João Almino é antes de tudo uma fascinante síntese das inúmeras seitas e religiões que circundam a racionalidade do plano piloto.[10]

Assim como os personagens de João Almino, Max Bense também opôs Brasília e Rio de Janeiro como polos extremos da experiência brasileira. De um lado, a régua e o compasso, de outro, o caos e o acaso; de um lado, o planalto, de outro, a montanha; de um lado, a geometria, de outro, a praia. “De fato”, completa Bense, “o Rio e Brasília encarnam duas ideias de fundação de uma cidade: a cidade como prolongamento da natureza habitável e a cidade como prolongamento da inteligência emancipada”.[11] A inteligência brasileira seria precisamente o cruzamento complexo das duas tendências. Vale dizer, o Palácio Gustavo Capanema e o Aterro do Flamengo no Rio de Janeiro; o crescimento desordenado e aparentemente incontrolável das cidades-satélites em Brasília. Vale dizer, a inteligência brasileira seria propriamente eclética. Nesse sentido, o projeto místico de Irís Quelemén só podia mesmo desenvolver-se em Brasília.

Retornamos, então, ao romance de Almino. Desta vez, o tempo privilegiado pelo autor recorda o impacto dos quadros mais célebres de Caravaggio. Refiro-me não apenas à técnica do claro-escuro. Aliás, essa técnica também estrutura o romance, no seu misto de informações objetivas sobre a construção de Brasília e o mistério jamais resolvido da morte e da origem de Valdivino, amante ou talvez filho da prostitua-profetisa – o narrador JA nunca bate o martelo e assim o leitor deve tirar suas próprias conclusões. Porém, mencionei o impacto de alguns dos quadros mais célebres de Caravaggio e pensava, sobretudo, no instante privilegiado pelo pintor: trata-se sempre do momento imediatamente anterior à cena principal, tal como consagrada pela tradição pictórica. Tal técnica que produz um forte efeito, pois o inesperado eclipse da imagem-clichê força o espectador a imaginar com olhos renovados a imagem deliberadamente subtraída. No caso de Cidade livre, Almino retorna ao passado-origem de seus 4 romances anteriores para fotografar o momento em que o futuro parecia encontra-se ao alcance de um presente acelerado, ou seja, a ação de Cidade livre concentra-se principalmente nos meses anteriores à inauguração de Brasília.

Por sua vez, o espaço privilegiado na narrativa destaca “a primeira cidade descartável, a Cidade Livre era construída para ser destruída”.[12] Portanto, esse “era o lugar da liberdade, onde era possível inventar, experimentar, criar a partir do nada, do vazio, do inútil, do desnecessário”,[13] como afirma Moacir, o pai do narrador, ele mesmo uma espécie de cronista do cotidiano miúdo da formação de Brasília. Recorde-se que o narrador JA também não deixa de reciclar os escritos do pai em sua escritura, compondo sua própria memória com a lembrança e o registro alheios.

(Aliás, permitam-me uma digressão, a fim de destacar outro tema que atravessa o romance e que apenas mencionarei, porque ele poderia por si só constituir o tema de outro artigo. Penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do tipo de escrita característica da civilização digital na qual nos transformamos, ou seja, penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do blog, compreendido em seu potencial de escritura.

Em tese, o narrador do romance decidiu “(…) criar um blog e ir publicando a história aqui, como folhetim do século XIX (…)”.[14] O novo meio, ao contrário do folhetim, permitiria pelo menos uma novidade formal: “(…) vocês leitores do blog podem corrigir à vontade, e, se tiverem algum caso a contar ou comentário a fazer, que não se intimidem”.[15] Ao longo da narrativa constrói-se um diálogo ora irônico, ora respeitosos, com os leitores do romance-blog, que às vezes também são tratados com os piparotes machadianos, como na seguinte passagem-homenagem a Machado de Assis: “À leitora apressadinha do blog que quer dar saltos na história, esclareço que ainda não é o momento de ir tão longe (…)”.[16] Nos seus cinco romances, aliás, Almino tem sempre incorporado com grande criatividade técnicas derivadas do universo audiovisual e digital, compondo um dos mais fecundos diálogos contemporâneos – e não me refiro apenas à literatura brasileira – acerca do lugar ou dos lugares da literatura e do literário.

Vejamos.

A fotografia e o cinema ocupam um papel fundamental em Ideias onde passar o fim do mundo. Uma máquina e, por que não?, uma espécie de processador de textos destacam-se em Samba enredo. A escrita como gesto autobiográfico domina Cinco estações do amor. A fotografia, mais uma vez, fornece a estrutura de O livro das emoções, porém uma fotografia cujas imagens são deliberadamente subtraídas, a fim de aguçar a imaginação do leitor. O leitor afoito talvez não compreenda o alcance do gesto ficcional de João Almino.

Afinal, é como se o centro dinâmico da vida cultural hoje em dia estivesse no cinema, no vídeo, na música pop, enfim, na internet – não mais na literatura. Não surpreenderá então o juízo de Wim Wenders: “Cinema e rock ’n’ roll são, cada vez mais, as duas expressões contemporâneas mais precisas, mais espontâneas. Tenho a impressão de que todas as outras formas de reflexão, sobretudo o teatro ou a literatura, são demasiado lentas, pesadas. O cinema e o rock ’n’ roll são consumidos em harmonia com nossa época de consumo. De uma maneira direta, rápida”.[17]

João Almino, creio, vai além dessa constatação em seus romances. Ora, repetimos sem pensar citações como a de Wenders como se elas não fossem o que de fato são: uma aceitação passiva da circunstância contemporânea, um surpreendente positivismo pós-moderno, como se o fato objetivo do predomínio dos meios audiovisuais e digitais, indispensáveis ao pleno fluxo do funcionamento do capitalismo atual, obrigasse a abraçar acriticamente os objetos da cultura audiovisual e digital, como se a tarefa do intelectual fosse a de justificar a hegemonia do momento. Pelo contrário, a ficção de Almino estimula a seguinte hipótese: a reflexão contemporânea sobre a literatura deve desdobrar as consequências do deslocamento do objeto livro do centro do circuito comunicativo. Posso dizê-lo de forma ainda mais clara: qualquer reflexão contemporânea sobre a literatura deve partir da teorização das consequências da centralidade dos meios audiovisuais e digitais na definição da cultura contemporânea. No século XXI, a literatura e a crítica literária ocupam um papel secundário, periférico mesmo, se comparadas à febre digital e a dominação já longeva dos recursos audiovisuais. Contudo, tanto esse papel secundário quanto o espaço-tempo Brasília podem ser vividos como espaço de liberdade e tempo de livre experimentação. Se não me equivoco, esse é o caminho escolhido pelo escritor João Almino.

Encerro a digressão, um tanto raivosa, reconheço, e retorno a outro eixo do romance Cidade Livre. )

O espaço-tempo representado pela Cidade Livre reconstruída na ficção de João Almino reúne dimensões em tese opostas; reunião cuja sutileza é uma das forças do romance, explicitando a arquitetura de seu ideário estético-literário. Vejamos como essas dimensões se encontram e já que menciono níveis diversos, nos próximos parágrafos transitarei da ficção ao ensaio de Almino, propondo uma espécie de Cidade Livre de suas preocupações.

Começo pela voz do engenheiro: “É como o presidente diz, observou Roberto, esta é a primeira capital construída do zero, num lugar desabitado, sem o apoio de nenhuma aldeia ou povoado”.[18] Encontra-se, nessa observação, a base do credo cartesiano de Max Bense, pois, claro está, nesse panorama desértico cabe à vontade racional o impulso de geometrizar o espaço virgem, na “emancipação da inteligência” que tanto o encantava. Porém, mais ou menos na metade do romance, caberá à profetisa-prostituta, Irís-Lucrécia, ecoar a mesma afirmação, conferindo-lhe, contudo, uma deriva muito diversa, bem próxima, aliás, dos estudos esotéricos de Iara Kern, que há algumas décadas chegou a ocupar bastante espaço na mídia com seu livro De Aknaton a JK.[19]

Escutemos a personagem de João Almino: “Eu quero encontrar o presidente, ele é o faraó egípcio Akhenaton da décima oitava dinastia, afirmou Lucrécia, categórica. JK ia construir não apenas uma cidade, mas uma civilização. O faraó, que governara entre 1353 e 1335 antes de Cristo, havia criado do nada, como em Brasília, a primeira capital planejada, Akhetaton”.[20] A analogia é impecável, especialmente se recordarmos que, e agora cito o ensaísta João Almino, “não falta à história do projeto de Brasília também a dimensão mística. D. Bosco, o santo fundador da ordem dos salesianos, teria tido em 1883 um sonho profético sobre a ‘Terra Prometida’ (…) onde seria fundada ‘uma nova civilização’”.[21]

E, com efeito, o Plano Piloto foi associado pelo próprio Lucio Costa à cruz cristã. Nas palavras do urbanista: “nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal-da-cruz”.[22] Irís Quelemén assinaria embaixo, sem dúvida. E não é tudo: a primeira capela de Brasília, a Ermida Dom Bosco, alude à profecia do santo, e, conforme o pai do narrador JÁ explicou: o presidente “escolhera a data de 3 de maio (para a primeira missa de Brasília) por sua proximidade do aniversário da missa mandada rezar por Pedro Álvares Cabral”.[23]

Não surpreende, portanto, que a própria Cidade Livre, cidade construída para ser destruída, tenha se transformado numa das futuras cidades-satélites que, em alguma medida, comprometem a racionalidade pretendida no Plano Piloto. É que, recorda o ensaísta, “com o tempo descobriu-se o óbvio: não é o plano urbanístico que molda a sociedade, mas esta que vai dando novos significados àquele”.[24] Por isso mesmo, nas palavras do romancista, próximo à conclusão de Cidade Livre, traduz-se o espanto de um jornalista estrangeiro em visita à nova capital: “A razão para o espanto não era a arquitetura de Oscar Niemeyer, nem o plano urbanístico de Lúcio Costa; eram as crenças e seitas que já proliferavam pelos seus arredores e a possibilidade de que Lucrécia, uma prostituta, viesse a ser profetisa”.[25]

A ficção de João Almino, portanto, procura dar forma a esse espanto e, ao fazê-lo, recorda a distinção do engenheiro Roberto entre a engenharia-prosa e a arquitetura-poesia. É como se Cidade Livre fosse a prosa do poema de João Cabral. Por isso, através de seus cinco romances, João Almino nos ajuda a habitar imaginariamente o edifício Brasília, ao mesmo tempo em que sua complexidade pode finalmente nos habitar.

 



[1] Professor de Literatura Comparada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

[2] Trata-se, sem dúvida, de alusão que leva o leitor de João Almino a pensar imediatamente no Machado de Assis de o Memorial de Aires, o M de A. Em outro texto, discuti a importância da obra machadiana na ficção de João Almino. O próprio escritor recentemente publicou um agudo ensaio dedicado à obra de Machado de Assis: O diabrete angélico e o pavão. Enredo e amor possíveis em Brás Cubas. Belo Horizonte: Editora UGMF, 2009.

[3] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 126.

[4] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 18.

[5] Idem, p. 8.

[6] João Cabral de Melo Neto. “Acompanhando Max Bense em sua visita a Brasília, 1961”. Museu de tudo. 1966-1974. Obra completa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994, p. 371.

[7] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 114.

[8] Max Bense. A inteligência brasileira. São Paulo: Cosac Naify, 2009, p. 18.

[9] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 90.

[10] Somente esse aspecto bem pode inspirar outro artigo. Uma abordagem inicial do assunto encontra-se no livro de Dioclécio Luz, Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986.

[11] Max Bense. Op. cit., p. 28.

[12] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 43.

[13] Idem, p. 223.

[14] Idem, p. 16.

[15] Idem, p. 16-17.

[16] Idem, p. 136.

[17] Wim Wenders. “O nome do novo”. Bravo! Entrevistas. São Paulo: D’Avila, 2002, p. 74.

[18] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 72.

[19] Iara Kern. De Aknaton a JK. Das pirâmides a Brasília. Lançado em 1984, o livro conheceu um grande êxito: “O livro já foi traduzido em seis idiomas (inclusive o japonês), gerou um filme, com roteiro da autora e direção de Pedro Torres e uma série de pinturas de Byron de Quevedo (reproduzidas na segunda edição”. Dioclécio Luz. Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986, p. 36.

[20] Idem, p. 131.

[21] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 12.

[22] Idem, p. 15.

[23] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 106.

[24] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 16.

[25] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 222.

 


Philia&Filia, Porto Alegre, vol. 01, n° 1, jan./jun. 2010

SSN 2178-1737

Nenhuma Brasília existe – a cidade na ficção livre de João Almino

 

João Cezar de Castro Rocha[1]

 

O título deste artigo aproveita a formulação de personagem de Cidade livre, o engenheiro Roberto Gonçalves. Em sua definição de Brasília, “Essa cidade é para ser uma cidade moderna, aberta ao mundo, não precisa ser pitoresca”. Desse modo, o engenheiro, orgulhoso do projeto de Lucio Costa e Oscar Niemeyer, respondia à objeção de Matilde, uma das tias do personagem-narrador, João, ou JA como ele assina a “introdução” do romance, ocultando assim seu nome completo.[2] Na crítica aberta de Matilde: “Não há nada de pitoresco neste lugar; se pelo menos houvesse umas montanhas…”. [3]

Essa suave discussão entre os dois personagens tanto sugere a tensão erótica que principia a se desenvolver entre eles quanto constitui um dos eixos centrais da estrutura ficcional de Cidade livre. Talvez dos cinco romances dedicados à cidade de Brasília, esse seja o que mais revela o ideário estético-literário do autor de Ideias onde passar o fim do mundo.

Aliás, uma vez mais, aproveito formulação de João Almino – esse outro JA. Em ensaio fundamental para a compreensão de sua arquitetura ficcional, o leitor encontra a seguinte reflexão: “Esta cidade sem raízes, povoada de migrantes, onde a identidade é aberta e múltipla, recusa a noção de origem única. Aqui as origens podem aparentar o que são de fato: mitos ou referências cambiantes. A cidade serve de vacina contra o pitoresco”.[4]

Compreenda-se bem o ponto: a recusa do pitoresco permite transformar a proposta teórica do ensaísta do “universalismo descentrado” no autêntico plano piloto do projeto literário do escritor. Ora, se o “universalismo descentrado” pretende “liberar a criação para que ela não fique presa a modas internacionais e nem mesmo a fronteiras ou raízes”,[5] então, localizar sua ficção obsessivamente em Brasília, com passagem eventual pelo Rio de Janeiro em O livro das emoções, tanto significa precisão geográfica quanto necessidade poética. É como se Brasília oferecesse o meridiano mais adequado para uma literatura cujo lugar desde sempre convidasse ao cruzamento complexo de imaginação e geometria, ficção e realidade, misticismo e racionalidade, na mistura improvável, mas muito instigante, de Lucio Costa e Dom Bosco, Oscar Niemeyer e Tia Neiva, Plano Piloto e Vale do Amanhecer.

Aliás, a divergência de Matilde e Roberto entre Brasília e Rio de Janeiro talvez se relacione com um aspecto importante do projeto estético de João Almino.

Assim, se não me equivoco, Brasília, para João Almino, menos do que território físico, localizado no Planalto Central, é uma “floresta de símbolos”, para recordar o célebre verso de Baudelaire. Ou seja, as contradições e paradoxos inerentes ao plano piloto fornecem matéria-prima ficcional de primeira ordem. Creio que posso esclarecer essa idéia recordando um poema de João Cabral de Melo Neto:

 

Enquanto com Max Bense eu ia

como que sua filosofia

mineral, toda esquadrias

do metal-luz dos meios-dias,

arquitetura se fazia:

mais um edifício sem entropia,

literalmente, se construía:

um edifício filosofia.

 

Enquanto Max Bense a visita

e a vai dizendo, Brasília,

eu também de visita ia:

ao edifício do que ele dizia;

edifício que, todavia,

de duas formas existia:

na de edifício em que se habita

e de edifício que nos habita.[6]

 

Afinal, ainda nas palavras do engenheiro Roberto, “engenharia é prosa, mas arquitetura é pura poesia”.[7] E, como se sabe, Max Bense visitou o Brasil diversas vezes, dedicando-se especialmente a compreender o sentido de Brasília para a civilização brasileira e para o mundo como um todo, esforço reflexivo que evoca o método do autor de Samba enredo. Gostaria, portanto, de propor um diálogo entre o “universalismo descentrado” de Almino e a forma como Bense definiu a “inteligência brasileira”. Em suas palavras: “A inteligência cartesiana é a decisão pela clareza consciente a despeito de se ter à disposição a terna obscuridade. Mas, por inteligência brasileira, entendo o desenvolvimento da clareza espiritual do país na direção de uma produtividade e de uma esperança autoconfiante naquilo que diz respeito ao método e ao estilo, à alegria e à melancolia”.[8]

Curiosamente essa é uma passagem muito pouco cartesiana que não deixa de evocar os devaneios espirituais da prostituta Lucrécia, isto é, da personagem que comparece nos cinco romances de João Almino, a líder espiritual Irís Quelemén, idolatrada no Jardim da Salvação. No fundo, o projeto de Irís-Lucrécia possui uma racionalidade impecável, representando o paroxismo da própria ideia de hibridismo cultural. Senão vejamos, “a Fraternidade Eclética Espiritualista Universal” profetizava a criação lógica da “Cidade Eclética [que] deve ser a Nova Jerusalém”; nessa cidade, a religião dominante seria logicamente eclética: “Não é uma religião, é uma mistura do que há de melhor nas religiões, para que haja a concórdia universal entre elas”.[9] Ao que tudo indica, a raça cósmica de José Vasconcelos encontrou sua religião e a racionalidade de Simão Bacamarte sua residência na terra, pois a profetisa de João Almino é antes de tudo uma fascinante síntese das inúmeras seitas e religiões que circundam a racionalidade do plano piloto.[10]

Assim como os personagens de João Almino, Max Bense também opôs Brasília e Rio de Janeiro como polos extremos da experiência brasileira. De um lado, a régua e o compasso, de outro, o caos e o acaso; de um lado, o planalto, de outro, a montanha; de um lado, a geometria, de outro, a praia. “De fato”, completa Bense, “o Rio e Brasília encarnam duas ideias de fundação de uma cidade: a cidade como prolongamento da natureza habitável e a cidade como prolongamento da inteligência emancipada”.[11] A inteligência brasileira seria precisamente o cruzamento complexo das duas tendências. Vale dizer, o Palácio Gustavo Capanema e o Aterro do Flamengo no Rio de Janeiro; o crescimento desordenado e aparentemente incontrolável das cidades-satélites em Brasília. Vale dizer, a inteligência brasileira seria propriamente eclética. Nesse sentido, o projeto místico de Irís Quelemén só podia mesmo desenvolver-se em Brasília.

Retornamos, então, ao romance de Almino. Desta vez, o tempo privilegiado pelo autor recorda o impacto dos quadros mais célebres de Caravaggio. Refiro-me não apenas à técnica do claro-escuro. Aliás, essa técnica também estrutura o romance, no seu misto de informações objetivas sobre a construção de Brasília e o mistério jamais resolvido da morte e da origem de Valdivino, amante ou talvez filho da prostitua-profetisa – o narrador JA nunca bate o martelo e assim o leitor deve tirar suas próprias conclusões. Porém, mencionei o impacto de alguns dos quadros mais célebres de Caravaggio e pensava, sobretudo, no instante privilegiado pelo pintor: trata-se sempre do momento imediatamente anterior à cena principal, tal como consagrada pela tradição pictórica. Tal técnica que produz um forte efeito, pois o inesperado eclipse da imagem-clichê força o espectador a imaginar com olhos renovados a imagem deliberadamente subtraída. No caso de Cidade livre, Almino retorna ao passado-origem de seus 4 romances anteriores para fotografar o momento em que o futuro parecia encontra-se ao alcance de um presente acelerado, ou seja, a ação de Cidade livre concentra-se principalmente nos meses anteriores à inauguração de Brasília.

Por sua vez, o espaço privilegiado na narrativa destaca “a primeira cidade descartável, a Cidade Livre era construída para ser destruída”.[12] Portanto, esse “era o lugar da liberdade, onde era possível inventar, experimentar, criar a partir do nada, do vazio, do inútil, do desnecessário”,[13] como afirma Moacir, o pai do narrador, ele mesmo uma espécie de cronista do cotidiano miúdo da formação de Brasília. Recorde-se que o narrador JA também não deixa de reciclar os escritos do pai em sua escritura, compondo sua própria memória com a lembrança e o registro alheios.

(Aliás, permitam-me uma digressão, a fim de destacar outro tema que atravessa o romance e que apenas mencionarei, porque ele poderia por si só constituir o tema de outro artigo. Penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do tipo de escrita característica da civilização digital na qual nos transformamos, ou seja, penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do blog, compreendido em seu potencial de escritura.

Em tese, o narrador do romance decidiu “(…) criar um blog e ir publicando a história aqui, como folhetim do século XIX (…)”.[14] O novo meio, ao contrário do folhetim, permitiria pelo menos uma novidade formal: “(…) vocês leitores do blog podem corrigir à vontade, e, se tiverem algum caso a contar ou comentário a fazer, que não se intimidem”.[15] Ao longo da narrativa constrói-se um diálogo ora irônico, ora respeitosos, com os leitores do romance-blog, que às vezes também são tratados com os piparotes machadianos, como na seguinte passagem-homenagem a Machado de Assis: “À leitora apressadinha do blog que quer dar saltos na história, esclareço que ainda não é o momento de ir tão longe (…)”.[16] Nos seus cinco romances, aliás, Almino tem sempre incorporado com grande criatividade técnicas derivadas do universo audiovisual e digital, compondo um dos mais fecundos diálogos contemporâneos – e não me refiro apenas à literatura brasileira – acerca do lugar ou dos lugares da literatura e do literário.

Vejamos.

A fotografia e o cinema ocupam um papel fundamental em Ideias onde passar o fim do mundo. Uma máquina e, por que não?, uma espécie de processador de textos destacam-se em Samba enredo. A escrita como gesto autobiográfico domina Cinco estações do amor. A fotografia, mais uma vez, fornece a estrutura de O livro das emoções, porém uma fotografia cujas imagens são deliberadamente subtraídas, a fim de aguçar a imaginação do leitor. O leitor afoito talvez não compreenda o alcance do gesto ficcional de João Almino.

Afinal, é como se o centro dinâmico da vida cultural hoje em dia estivesse no cinema, no vídeo, na música pop, enfim, na internet – não mais na literatura. Não surpreenderá então o juízo de Wim Wenders: “Cinema e rock ’n’ roll são, cada vez mais, as duas expressões contemporâneas mais precisas, mais espontâneas. Tenho a impressão de que todas as outras formas de reflexão, sobretudo o teatro ou a literatura, são demasiado lentas, pesadas. O cinema e o rock ’n’ roll são consumidos em harmonia com nossa época de consumo. De uma maneira direta, rápida”.[17]

João Almino, creio, vai além dessa constatação em seus romances. Ora, repetimos sem pensar citações como a de Wenders como se elas não fossem o que de fato são: uma aceitação passiva da circunstância contemporânea, um surpreendente positivismo pós-moderno, como se o fato objetivo do predomínio dos meios audiovisuais e digitais, indispensáveis ao pleno fluxo do funcionamento do capitalismo atual, obrigasse a abraçar acriticamente os objetos da cultura audiovisual e digital, como se a tarefa do intelectual fosse a de justificar a hegemonia do momento. Pelo contrário, a ficção de Almino estimula a seguinte hipótese: a reflexão contemporânea sobre a literatura deve desdobrar as consequências do deslocamento do objeto livro do centro do circuito comunicativo. Posso dizê-lo de forma ainda mais clara: qualquer reflexão contemporânea sobre a literatura deve partir da teorização das consequências da centralidade dos meios audiovisuais e digitais na definição da cultura contemporânea. No século XXI, a literatura e a crítica literária ocupam um papel secundário, periférico mesmo, se comparadas à febre digital e a dominação já longeva dos recursos audiovisuais. Contudo, tanto esse papel secundário quanto o espaço-tempo Brasília podem ser vividos como espaço de liberdade e tempo de livre experimentação. Se não me equivoco, esse é o caminho escolhido pelo escritor João Almino.

Encerro a digressão, um tanto raivosa, reconheço, e retorno a outro eixo do romance Cidade Livre. )

O espaço-tempo representado pela Cidade Livre reconstruída na ficção de João Almino reúne dimensões em tese opostas; reunião cuja sutileza é uma das forças do romance, explicitando a arquitetura de seu ideário estético-literário. Vejamos como essas dimensões se encontram e já que menciono níveis diversos, nos próximos parágrafos transitarei da ficção ao ensaio de Almino, propondo uma espécie de Cidade Livre de suas preocupações.

Começo pela voz do engenheiro: “É como o presidente diz, observou Roberto, esta é a primeira capital construída do zero, num lugar desabitado, sem o apoio de nenhuma aldeia ou povoado”.[18] Encontra-se, nessa observação, a base do credo cartesiano de Max Bense, pois, claro está, nesse panorama desértico cabe à vontade racional o impulso de geometrizar o espaço virgem, na “emancipação da inteligência” que tanto o encantava. Porém, mais ou menos na metade do romance, caberá à profetisa-prostituta, Irís-Lucrécia, ecoar a mesma afirmação, conferindo-lhe, contudo, uma deriva muito diversa, bem próxima, aliás, dos estudos esotéricos de Iara Kern, que há algumas décadas chegou a ocupar bastante espaço na mídia com seu livro De Aknaton a JK.[19]

Escutemos a personagem de João Almino: “Eu quero encontrar o presidente, ele é o faraó egípcio Akhenaton da décima oitava dinastia, afirmou Lucrécia, categórica. JK ia construir não apenas uma cidade, mas uma civilização. O faraó, que governara entre 1353 e 1335 antes de Cristo, havia criado do nada, como em Brasília, a primeira capital planejada, Akhetaton”.[20] A analogia é impecável, especialmente se recordarmos que, e agora cito o ensaísta João Almino, “não falta à história do projeto de Brasília também a dimensão mística. D. Bosco, o santo fundador da ordem dos salesianos, teria tido em 1883 um sonho profético sobre a ‘Terra Prometida’ (…) onde seria fundada ‘uma nova civilização’”.[21]

E, com efeito, o Plano Piloto foi associado pelo próprio Lucio Costa à cruz cristã. Nas palavras do urbanista: “nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal-da-cruz”.[22] Irís Quelemén assinaria embaixo, sem dúvida. E não é tudo: a primeira capela de Brasília, a Ermida Dom Bosco, alude à profecia do santo, e, conforme o pai do narrador JÁ explicou: o presidente “escolhera a data de 3 de maio (para a primeira missa de Brasília) por sua proximidade do aniversário da missa mandada rezar por Pedro Álvares Cabral”.[23]

Não surpreende, portanto, que a própria Cidade Livre, cidade construída para ser destruída, tenha se transformado numa das futuras cidades-satélites que, em alguma medida, comprometem a racionalidade pretendida no Plano Piloto. É que, recorda o ensaísta, “com o tempo descobriu-se o óbvio: não é o plano urbanístico que molda a sociedade, mas esta que vai dando novos significados àquele”.[24] Por isso mesmo, nas palavras do romancista, próximo à conclusão de Cidade Livre, traduz-se o espanto de um jornalista estrangeiro em visita à nova capital: “A razão para o espanto não era a arquitetura de Oscar Niemeyer, nem o plano urbanístico de Lúcio Costa; eram as crenças e seitas que já proliferavam pelos seus arredores e a possibilidade de que Lucrécia, uma prostituta, viesse a ser profetisa”.[25]

A ficção de João Almino, portanto, procura dar forma a esse espanto e, ao fazê-lo, recorda a distinção do engenheiro Roberto entre a engenharia-prosa e a arquitetura-poesia. É como se Cidade Livre fosse a prosa do poema de João Cabral. Por isso, através de seus cinco romances, João Almino nos ajuda a habitar imaginariamente o edifício Brasília, ao mesmo tempo em que sua complexidade pode finalmente nos habitar.

 



[1] Professor de Literatura Comparada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

[2] Trata-se, sem dúvida, de alusão que leva o leitor de João Almino a pensar imediatamente no Machado de Assis de o Memorial de Aires, o M de A. Em outro texto, discuti a importância da obra machadiana na ficção de João Almino. O próprio escritor recentemente publicou um agudo ensaio dedicado à obra de Machado de Assis: O diabrete angélico e o pavão. Enredo e amor possíveis em Brás Cubas. Belo Horizonte: Editora UGMF, 2009.

[3] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 126.

[4] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 18.

[5] Idem, p. 8.

[6] João Cabral de Melo Neto. “Acompanhando Max Bense em sua visita a Brasília, 1961”. Museu de tudo. 1966-1974. Obra completa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994, p. 371.

[7] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 114.

[8] Max Bense. A inteligência brasileira. São Paulo: Cosac Naify, 2009, p. 18.

[9] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 90.

[10] Somente esse aspecto bem pode inspirar outro artigo. Uma abordagem inicial do assunto encontra-se no livro de Dioclécio Luz, Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986.

[11] Max Bense. Op. cit., p. 28.

[12] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 43.

[13] Idem, p. 223.

[14] Idem, p. 16.

[15] Idem, p. 16-17.

[16] Idem, p. 136.

[17] Wim Wenders. “O nome do novo”. Bravo! Entrevistas. São Paulo: D’Avila, 2002, p. 74.

[18] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 72.

[19] Iara Kern. De Aknaton a JK. Das pirâmides a Brasília. Lançado em 1984, o livro conheceu um grande êxito: “O livro já foi traduzido em seis idiomas (inclusive o japonês), gerou um filme, com roteiro da autora e direção de Pedro Torres e uma série de pinturas de Byron de Quevedo (reproduzidas na segunda edição”. Dioclécio Luz. Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986, p. 36.

[20] Idem, p. 131.

[21] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 12.

[22] Idem, p. 15.

[23] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 106.

[24] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 16.

[25] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 222.

 


Philia&Filia, Porto Alegre, vol. 01, n° 1, jan./jun. 2010

SSN 2178-1737

Nenhuma Brasília existe – a cidade na ficção livre de João Almino

 

João Cezar de Castro Rocha[1]

 

O título deste artigo aproveita a formulação de personagem de Cidade livre, o engenheiro Roberto Gonçalves. Em sua definição de Brasília, “Essa cidade é para ser uma cidade moderna, aberta ao mundo, não precisa ser pitoresca”. Desse modo, o engenheiro, orgulhoso do projeto de Lucio Costa e Oscar Niemeyer, respondia à objeção de Matilde, uma das tias do personagem-narrador, João, ou JA como ele assina a “introdução” do romance, ocultando assim seu nome completo.[2] Na crítica aberta de Matilde: “Não há nada de pitoresco neste lugar; se pelo menos houvesse umas montanhas…”. [3]

Essa suave discussão entre os dois personagens tanto sugere a tensão erótica que principia a se desenvolver entre eles quanto constitui um dos eixos centrais da estrutura ficcional de Cidade livre. Talvez dos cinco romances dedicados à cidade de Brasília, esse seja o que mais revela o ideário estético-literário do autor de Ideias onde passar o fim do mundo.

Aliás, uma vez mais, aproveito formulação de João Almino – esse outro JA. Em ensaio fundamental para a compreensão de sua arquitetura ficcional, o leitor encontra a seguinte reflexão: “Esta cidade sem raízes, povoada de migrantes, onde a identidade é aberta e múltipla, recusa a noção de origem única. Aqui as origens podem aparentar o que são de fato: mitos ou referências cambiantes. A cidade serve de vacina contra o pitoresco”.[4]

Compreenda-se bem o ponto: a recusa do pitoresco permite transformar a proposta teórica do ensaísta do “universalismo descentrado” no autêntico plano piloto do projeto literário do escritor. Ora, se o “universalismo descentrado” pretende “liberar a criação para que ela não fique presa a modas internacionais e nem mesmo a fronteiras ou raízes”,[5] então, localizar sua ficção obsessivamente em Brasília, com passagem eventual pelo Rio de Janeiro em O livro das emoções, tanto significa precisão geográfica quanto necessidade poética. É como se Brasília oferecesse o meridiano mais adequado para uma literatura cujo lugar desde sempre convidasse ao cruzamento complexo de imaginação e geometria, ficção e realidade, misticismo e racionalidade, na mistura improvável, mas muito instigante, de Lucio Costa e Dom Bosco, Oscar Niemeyer e Tia Neiva, Plano Piloto e Vale do Amanhecer.

Aliás, a divergência de Matilde e Roberto entre Brasília e Rio de Janeiro talvez se relacione com um aspecto importante do projeto estético de João Almino.

Assim, se não me equivoco, Brasília, para João Almino, menos do que território físico, localizado no Planalto Central, é uma “floresta de símbolos”, para recordar o célebre verso de Baudelaire. Ou seja, as contradições e paradoxos inerentes ao plano piloto fornecem matéria-prima ficcional de primeira ordem. Creio que posso esclarecer essa idéia recordando um poema de João Cabral de Melo Neto:

 

Enquanto com Max Bense eu ia

como que sua filosofia

mineral, toda esquadrias

do metal-luz dos meios-dias,

arquitetura se fazia:

mais um edifício sem entropia,

literalmente, se construía:

um edifício filosofia.

 

Enquanto Max Bense a visita

e a vai dizendo, Brasília,

eu também de visita ia:

ao edifício do que ele dizia;

edifício que, todavia,

de duas formas existia:

na de edifício em que se habita

e de edifício que nos habita.[6]

 

Afinal, ainda nas palavras do engenheiro Roberto, “engenharia é prosa, mas arquitetura é pura poesia”.[7] E, como se sabe, Max Bense visitou o Brasil diversas vezes, dedicando-se especialmente a compreender o sentido de Brasília para a civilização brasileira e para o mundo como um todo, esforço reflexivo que evoca o método do autor de Samba enredo. Gostaria, portanto, de propor um diálogo entre o “universalismo descentrado” de Almino e a forma como Bense definiu a “inteligência brasileira”. Em suas palavras: “A inteligência cartesiana é a decisão pela clareza consciente a despeito de se ter à disposição a terna obscuridade. Mas, por inteligência brasileira, entendo o desenvolvimento da clareza espiritual do país na direção de uma produtividade e de uma esperança autoconfiante naquilo que diz respeito ao método e ao estilo, à alegria e à melancolia”.[8]

Curiosamente essa é uma passagem muito pouco cartesiana que não deixa de evocar os devaneios espirituais da prostituta Lucrécia, isto é, da personagem que comparece nos cinco romances de João Almino, a líder espiritual Irís Quelemén, idolatrada no Jardim da Salvação. No fundo, o projeto de Irís-Lucrécia possui uma racionalidade impecável, representando o paroxismo da própria ideia de hibridismo cultural. Senão vejamos, “a Fraternidade Eclética Espiritualista Universal” profetizava a criação lógica da “Cidade Eclética [que] deve ser a Nova Jerusalém”; nessa cidade, a religião dominante seria logicamente eclética: “Não é uma religião, é uma mistura do que há de melhor nas religiões, para que haja a concórdia universal entre elas”.[9] Ao que tudo indica, a raça cósmica de José Vasconcelos encontrou sua religião e a racionalidade de Simão Bacamarte sua residência na terra, pois a profetisa de João Almino é antes de tudo uma fascinante síntese das inúmeras seitas e religiões que circundam a racionalidade do plano piloto.[10]

Assim como os personagens de João Almino, Max Bense também opôs Brasília e Rio de Janeiro como polos extremos da experiência brasileira. De um lado, a régua e o compasso, de outro, o caos e o acaso; de um lado, o planalto, de outro, a montanha; de um lado, a geometria, de outro, a praia. “De fato”, completa Bense, “o Rio e Brasília encarnam duas ideias de fundação de uma cidade: a cidade como prolongamento da natureza habitável e a cidade como prolongamento da inteligência emancipada”.[11] A inteligência brasileira seria precisamente o cruzamento complexo das duas tendências. Vale dizer, o Palácio Gustavo Capanema e o Aterro do Flamengo no Rio de Janeiro; o crescimento desordenado e aparentemente incontrolável das cidades-satélites em Brasília. Vale dizer, a inteligência brasileira seria propriamente eclética. Nesse sentido, o projeto místico de Irís Quelemén só podia mesmo desenvolver-se em Brasília.

Retornamos, então, ao romance de Almino. Desta vez, o tempo privilegiado pelo autor recorda o impacto dos quadros mais célebres de Caravaggio. Refiro-me não apenas à técnica do claro-escuro. Aliás, essa técnica também estrutura o romance, no seu misto de informações objetivas sobre a construção de Brasília e o mistério jamais resolvido da morte e da origem de Valdivino, amante ou talvez filho da prostitua-profetisa – o narrador JA nunca bate o martelo e assim o leitor deve tirar suas próprias conclusões. Porém, mencionei o impacto de alguns dos quadros mais célebres de Caravaggio e pensava, sobretudo, no instante privilegiado pelo pintor: trata-se sempre do momento imediatamente anterior à cena principal, tal como consagrada pela tradição pictórica. Tal técnica que produz um forte efeito, pois o inesperado eclipse da imagem-clichê força o espectador a imaginar com olhos renovados a imagem deliberadamente subtraída. No caso de Cidade livre, Almino retorna ao passado-origem de seus 4 romances anteriores para fotografar o momento em que o futuro parecia encontra-se ao alcance de um presente acelerado, ou seja, a ação de Cidade livre concentra-se principalmente nos meses anteriores à inauguração de Brasília.

Por sua vez, o espaço privilegiado na narrativa destaca “a primeira cidade descartável, a Cidade Livre era construída para ser destruída”.[12] Portanto, esse “era o lugar da liberdade, onde era possível inventar, experimentar, criar a partir do nada, do vazio, do inútil, do desnecessário”,[13] como afirma Moacir, o pai do narrador, ele mesmo uma espécie de cronista do cotidiano miúdo da formação de Brasília. Recorde-se que o narrador JA também não deixa de reciclar os escritos do pai em sua escritura, compondo sua própria memória com a lembrança e o registro alheios.

(Aliás, permitam-me uma digressão, a fim de destacar outro tema que atravessa o romance e que apenas mencionarei, porque ele poderia por si só constituir o tema de outro artigo. Penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do tipo de escrita característica da civilização digital na qual nos transformamos, ou seja, penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do blog, compreendido em seu potencial de escritura.

Em tese, o narrador do romance decidiu “(…) criar um blog e ir publicando a história aqui, como folhetim do século XIX (…)”.[14] O novo meio, ao contrário do folhetim, permitiria pelo menos uma novidade formal: “(…) vocês leitores do blog podem corrigir à vontade, e, se tiverem algum caso a contar ou comentário a fazer, que não se intimidem”.[15] Ao longo da narrativa constrói-se um diálogo ora irônico, ora respeitosos, com os leitores do romance-blog, que às vezes também são tratados com os piparotes machadianos, como na seguinte passagem-homenagem a Machado de Assis: “À leitora apressadinha do blog que quer dar saltos na história, esclareço que ainda não é o momento de ir tão longe (…)”.[16] Nos seus cinco romances, aliás, Almino tem sempre incorporado com grande criatividade técnicas derivadas do universo audiovisual e digital, compondo um dos mais fecundos diálogos contemporâneos – e não me refiro apenas à literatura brasileira – acerca do lugar ou dos lugares da literatura e do literário.

Vejamos.

A fotografia e o cinema ocupam um papel fundamental em Ideias onde passar o fim do mundo. Uma máquina e, por que não?, uma espécie de processador de textos destacam-se em Samba enredo. A escrita como gesto autobiográfico domina Cinco estações do amor. A fotografia, mais uma vez, fornece a estrutura de O livro das emoções, porém uma fotografia cujas imagens são deliberadamente subtraídas, a fim de aguçar a imaginação do leitor. O leitor afoito talvez não compreenda o alcance do gesto ficcional de João Almino.

Afinal, é como se o centro dinâmico da vida cultural hoje em dia estivesse no cinema, no vídeo, na música pop, enfim, na internet – não mais na literatura. Não surpreenderá então o juízo de Wim Wenders: “Cinema e rock ’n’ roll são, cada vez mais, as duas expressões contemporâneas mais precisas, mais espontâneas. Tenho a impressão de que todas as outras formas de reflexão, sobretudo o teatro ou a literatura, são demasiado lentas, pesadas. O cinema e o rock ’n’ roll são consumidos em harmonia com nossa época de consumo. De uma maneira direta, rápida”.[17]

João Almino, creio, vai além dessa constatação em seus romances. Ora, repetimos sem pensar citações como a de Wenders como se elas não fossem o que de fato são: uma aceitação passiva da circunstância contemporânea, um surpreendente positivismo pós-moderno, como se o fato objetivo do predomínio dos meios audiovisuais e digitais, indispensáveis ao pleno fluxo do funcionamento do capitalismo atual, obrigasse a abraçar acriticamente os objetos da cultura audiovisual e digital, como se a tarefa do intelectual fosse a de justificar a hegemonia do momento. Pelo contrário, a ficção de Almino estimula a seguinte hipótese: a reflexão contemporânea sobre a literatura deve desdobrar as consequências do deslocamento do objeto livro do centro do circuito comunicativo. Posso dizê-lo de forma ainda mais clara: qualquer reflexão contemporânea sobre a literatura deve partir da teorização das consequências da centralidade dos meios audiovisuais e digitais na definição da cultura contemporânea. No século XXI, a literatura e a crítica literária ocupam um papel secundário, periférico mesmo, se comparadas à febre digital e a dominação já longeva dos recursos audiovisuais. Contudo, tanto esse papel secundário quanto o espaço-tempo Brasília podem ser vividos como espaço de liberdade e tempo de livre experimentação. Se não me equivoco, esse é o caminho escolhido pelo escritor João Almino.

Encerro a digressão, um tanto raivosa, reconheço, e retorno a outro eixo do romance Cidade Livre. )

O espaço-tempo representado pela Cidade Livre reconstruída na ficção de João Almino reúne dimensões em tese opostas; reunião cuja sutileza é uma das forças do romance, explicitando a arquitetura de seu ideário estético-literário. Vejamos como essas dimensões se encontram e já que menciono níveis diversos, nos próximos parágrafos transitarei da ficção ao ensaio de Almino, propondo uma espécie de Cidade Livre de suas preocupações.

Começo pela voz do engenheiro: “É como o presidente diz, observou Roberto, esta é a primeira capital construída do zero, num lugar desabitado, sem o apoio de nenhuma aldeia ou povoado”.[18] Encontra-se, nessa observação, a base do credo cartesiano de Max Bense, pois, claro está, nesse panorama desértico cabe à vontade racional o impulso de geometrizar o espaço virgem, na “emancipação da inteligência” que tanto o encantava. Porém, mais ou menos na metade do romance, caberá à profetisa-prostituta, Irís-Lucrécia, ecoar a mesma afirmação, conferindo-lhe, contudo, uma deriva muito diversa, bem próxima, aliás, dos estudos esotéricos de Iara Kern, que há algumas décadas chegou a ocupar bastante espaço na mídia com seu livro De Aknaton a JK.[19]

Escutemos a personagem de João Almino: “Eu quero encontrar o presidente, ele é o faraó egípcio Akhenaton da décima oitava dinastia, afirmou Lucrécia, categórica. JK ia construir não apenas uma cidade, mas uma civilização. O faraó, que governara entre 1353 e 1335 antes de Cristo, havia criado do nada, como em Brasília, a primeira capital planejada, Akhetaton”.[20] A analogia é impecável, especialmente se recordarmos que, e agora cito o ensaísta João Almino, “não falta à história do projeto de Brasília também a dimensão mística. D. Bosco, o santo fundador da ordem dos salesianos, teria tido em 1883 um sonho profético sobre a ‘Terra Prometida’ (…) onde seria fundada ‘uma nova civilização’”.[21]

E, com efeito, o Plano Piloto foi associado pelo próprio Lucio Costa à cruz cristã. Nas palavras do urbanista: “nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal-da-cruz”.[22] Irís Quelemén assinaria embaixo, sem dúvida. E não é tudo: a primeira capela de Brasília, a Ermida Dom Bosco, alude à profecia do santo, e, conforme o pai do narrador JÁ explicou: o presidente “escolhera a data de 3 de maio (para a primeira missa de Brasília) por sua proximidade do aniversário da missa mandada rezar por Pedro Álvares Cabral”.[23]

Não surpreende, portanto, que a própria Cidade Livre, cidade construída para ser destruída, tenha se transformado numa das futuras cidades-satélites que, em alguma medida, comprometem a racionalidade pretendida no Plano Piloto. É que, recorda o ensaísta, “com o tempo descobriu-se o óbvio: não é o plano urbanístico que molda a sociedade, mas esta que vai dando novos significados àquele”.[24] Por isso mesmo, nas palavras do romancista, próximo à conclusão de Cidade Livre, traduz-se o espanto de um jornalista estrangeiro em visita à nova capital: “A razão para o espanto não era a arquitetura de Oscar Niemeyer, nem o plano urbanístico de Lúcio Costa; eram as crenças e seitas que já proliferavam pelos seus arredores e a possibilidade de que Lucrécia, uma prostituta, viesse a ser profetisa”.[25]

A ficção de João Almino, portanto, procura dar forma a esse espanto e, ao fazê-lo, recorda a distinção do engenheiro Roberto entre a engenharia-prosa e a arquitetura-poesia. É como se Cidade Livre fosse a prosa do poema de João Cabral. Por isso, através de seus cinco romances, João Almino nos ajuda a habitar imaginariamente o edifício Brasília, ao mesmo tempo em que sua complexidade pode finalmente nos habitar.

 



[1] Professor de Literatura Comparada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

[2] Trata-se, sem dúvida, de alusão que leva o leitor de João Almino a pensar imediatamente no Machado de Assis de o Memorial de Aires, o M de A. Em outro texto, discuti a importância da obra machadiana na ficção de João Almino. O próprio escritor recentemente publicou um agudo ensaio dedicado à obra de Machado de Assis: O diabrete angélico e o pavão. Enredo e amor possíveis em Brás Cubas. Belo Horizonte: Editora UGMF, 2009.

[3] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 126.

[4] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 18.

[5] Idem, p. 8.

[6] João Cabral de Melo Neto. “Acompanhando Max Bense em sua visita a Brasília, 1961”. Museu de tudo. 1966-1974. Obra completa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994, p. 371.

[7] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 114.

[8] Max Bense. A inteligência brasileira. São Paulo: Cosac Naify, 2009, p. 18.

[9] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 90.

[10] Somente esse aspecto bem pode inspirar outro artigo. Uma abordagem inicial do assunto encontra-se no livro de Dioclécio Luz, Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986.

[11] Max Bense. Op. cit., p. 28.

[12] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 43.

[13] Idem, p. 223.

[14] Idem, p. 16.

[15] Idem, p. 16-17.

[16] Idem, p. 136.

[17] Wim Wenders. “O nome do novo”. Bravo! Entrevistas. São Paulo: D’Avila, 2002, p. 74.

[18] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 72.

[19] Iara Kern. De Aknaton a JK. Das pirâmides a Brasília. Lançado em 1984, o livro conheceu um grande êxito: “O livro já foi traduzido em seis idiomas (inclusive o japonês), gerou um filme, com roteiro da autora e direção de Pedro Torres e uma série de pinturas de Byron de Quevedo (reproduzidas na segunda edição”. Dioclécio Luz. Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986, p. 36.

[20] Idem, p. 131.

[21] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 12.

[22] Idem, p. 15.

[23] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 106.

[24] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 16.

[25] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 222.

 

 


Philia&Filia, Porto Alegre, vol. 01, n° 1, jan./jun. 2010

SSN 2178-1737

Nenhuma Brasília existe – a cidade na ficção livre de João Almino

 

João Cezar de Castro Rocha[1]

 

O título deste artigo aproveita a formulação de personagem de Cidade livre, o engenheiro Roberto Gonçalves. Em sua definição de Brasília, “Essa cidade é para ser uma cidade moderna, aberta ao mundo, não precisa ser pitoresca”. Desse modo, o engenheiro, orgulhoso do projeto de Lucio Costa e Oscar Niemeyer, respondia à objeção de Matilde, uma das tias do personagem-narrador, João, ou JA como ele assina a “introdução” do romance, ocultando assim seu nome completo.[2] Na crítica aberta de Matilde: “Não há nada de pitoresco neste lugar; se pelo menos houvesse umas montanhas…”. [3]

Essa suave discussão entre os dois personagens tanto sugere a tensão erótica que principia a se desenvolver entre eles quanto constitui um dos eixos centrais da estrutura ficcional de Cidade livre. Talvez dos cinco romances dedicados à cidade de Brasília, esse seja o que mais revela o ideário estético-literário do autor de Ideias onde passar o fim do mundo.

Aliás, uma vez mais, aproveito formulação de João Almino – esse outro JA. Em ensaio fundamental para a compreensão de sua arquitetura ficcional, o leitor encontra a seguinte reflexão: “Esta cidade sem raízes, povoada de migrantes, onde a identidade é aberta e múltipla, recusa a noção de origem única. Aqui as origens podem aparentar o que são de fato: mitos ou referências cambiantes. A cidade serve de vacina contra o pitoresco”.[4]

Compreenda-se bem o ponto: a recusa do pitoresco permite transformar a proposta teórica do ensaísta do “universalismo descentrado” no autêntico plano piloto do projeto literário do escritor. Ora, se o “universalismo descentrado” pretende “liberar a criação para que ela não fique presa a modas internacionais e nem mesmo a fronteiras ou raízes”,[5] então, localizar sua ficção obsessivamente em Brasília, com passagem eventual pelo Rio de Janeiro em O livro das emoções, tanto significa precisão geográfica quanto necessidade poética. É como se Brasília oferecesse o meridiano mais adequado para uma literatura cujo lugar desde sempre convidasse ao cruzamento complexo de imaginação e geometria, ficção e realidade, misticismo e racionalidade, na mistura improvável, mas muito instigante, de Lucio Costa e Dom Bosco, Oscar Niemeyer e Tia Neiva, Plano Piloto e Vale do Amanhecer.

Aliás, a divergência de Matilde e Roberto entre Brasília e Rio de Janeiro talvez se relacione com um aspecto importante do projeto estético de João Almino.

Assim, se não me equivoco, Brasília, para João Almino, menos do que território físico, localizado no Planalto Central, é uma “floresta de símbolos”, para recordar o célebre verso de Baudelaire. Ou seja, as contradições e paradoxos inerentes ao plano piloto fornecem matéria-prima ficcional de primeira ordem. Creio que posso esclarecer essa idéia recordando um poema de João Cabral de Melo Neto:

 

Enquanto com Max Bense eu ia

como que sua filosofia

mineral, toda esquadrias

do metal-luz dos meios-dias,

arquitetura se fazia:

mais um edifício sem entropia,

literalmente, se construía:

um edifício filosofia.

 

Enquanto Max Bense a visita

e a vai dizendo, Brasília,

eu também de visita ia:

ao edifício do que ele dizia;

edifício que, todavia,

de duas formas existia:

na de edifício em que se habita

e de edifício que nos habita.[6]

 

Afinal, ainda nas palavras do engenheiro Roberto, “engenharia é prosa, mas arquitetura é pura poesia”.[7] E, como se sabe, Max Bense visitou o Brasil diversas vezes, dedicando-se especialmente a compreender o sentido de Brasília para a civilização brasileira e para o mundo como um todo, esforço reflexivo que evoca o método do autor de Samba enredo. Gostaria, portanto, de propor um diálogo entre o “universalismo descentrado” de Almino e a forma como Bense definiu a “inteligência brasileira”. Em suas palavras: “A inteligência cartesiana é a decisão pela clareza consciente a despeito de se ter à disposição a terna obscuridade. Mas, por inteligência brasileira, entendo o desenvolvimento da clareza espiritual do país na direção de uma produtividade e de uma esperança autoconfiante naquilo que diz respeito ao método e ao estilo, à alegria e à melancolia”.[8]

Curiosamente essa é uma passagem muito pouco cartesiana que não deixa de evocar os devaneios espirituais da prostituta Lucrécia, isto é, da personagem que comparece nos cinco romances de João Almino, a líder espiritual Irís Quelemén, idolatrada no Jardim da Salvação. No fundo, o projeto de Irís-Lucrécia possui uma racionalidade impecável, representando o paroxismo da própria ideia de hibridismo cultural. Senão vejamos, “a Fraternidade Eclética Espiritualista Universal” profetizava a criação lógica da “Cidade Eclética [que] deve ser a Nova Jerusalém”; nessa cidade, a religião dominante seria logicamente eclética: “Não é uma religião, é uma mistura do que há de melhor nas religiões, para que haja a concórdia universal entre elas”.[9] Ao que tudo indica, a raça cósmica de José Vasconcelos encontrou sua religião e a racionalidade de Simão Bacamarte sua residência na terra, pois a profetisa de João Almino é antes de tudo uma fascinante síntese das inúmeras seitas e religiões que circundam a racionalidade do plano piloto.[10]

Assim como os personagens de João Almino, Max Bense também opôs Brasília e Rio de Janeiro como polos extremos da experiência brasileira. De um lado, a régua e o compasso, de outro, o caos e o acaso; de um lado, o planalto, de outro, a montanha; de um lado, a geometria, de outro, a praia. “De fato”, completa Bense, “o Rio e Brasília encarnam duas ideias de fundação de uma cidade: a cidade como prolongamento da natureza habitável e a cidade como prolongamento da inteligência emancipada”.[11] A inteligência brasileira seria precisamente o cruzamento complexo das duas tendências. Vale dizer, o Palácio Gustavo Capanema e o Aterro do Flamengo no Rio de Janeiro; o crescimento desordenado e aparentemente incontrolável das cidades-satélites em Brasília. Vale dizer, a inteligência brasileira seria propriamente eclética. Nesse sentido, o projeto místico de Irís Quelemén só podia mesmo desenvolver-se em Brasília.

Retornamos, então, ao romance de Almino. Desta vez, o tempo privilegiado pelo autor recorda o impacto dos quadros mais célebres de Caravaggio. Refiro-me não apenas à técnica do claro-escuro. Aliás, essa técnica também estrutura o romance, no seu misto de informações objetivas sobre a construção de Brasília e o mistério jamais resolvido da morte e da origem de Valdivino, amante ou talvez filho da prostitua-profetisa – o narrador JA nunca bate o martelo e assim o leitor deve tirar suas próprias conclusões. Porém, mencionei o impacto de alguns dos quadros mais célebres de Caravaggio e pensava, sobretudo, no instante privilegiado pelo pintor: trata-se sempre do momento imediatamente anterior à cena principal, tal como consagrada pela tradição pictórica. Tal técnica que produz um forte efeito, pois o inesperado eclipse da imagem-clichê força o espectador a imaginar com olhos renovados a imagem deliberadamente subtraída. No caso de Cidade livre, Almino retorna ao passado-origem de seus 4 romances anteriores para fotografar o momento em que o futuro parecia encontra-se ao alcance de um presente acelerado, ou seja, a ação de Cidade livre concentra-se principalmente nos meses anteriores à inauguração de Brasília.

Por sua vez, o espaço privilegiado na narrativa destaca “a primeira cidade descartável, a Cidade Livre era construída para ser destruída”.[12] Portanto, esse “era o lugar da liberdade, onde era possível inventar, experimentar, criar a partir do nada, do vazio, do inútil, do desnecessário”,[13] como afirma Moacir, o pai do narrador, ele mesmo uma espécie de cronista do cotidiano miúdo da formação de Brasília. Recorde-se que o narrador JA também não deixa de reciclar os escritos do pai em sua escritura, compondo sua própria memória com a lembrança e o registro alheios.

(Aliás, permitam-me uma digressão, a fim de destacar outro tema que atravessa o romance e que apenas mencionarei, porque ele poderia por si só constituir o tema de outro artigo. Penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do tipo de escrita característica da civilização digital na qual nos transformamos, ou seja, penso no uso criativo e provocador que João Almino realiza do blog, compreendido em seu potencial de escritura.

Em tese, o narrador do romance decidiu “(…) criar um blog e ir publicando a história aqui, como folhetim do século XIX (…)”.[14] O novo meio, ao contrário do folhetim, permitiria pelo menos uma novidade formal: “(…) vocês leitores do blog podem corrigir à vontade, e, se tiverem algum caso a contar ou comentário a fazer, que não se intimidem”.[15] Ao longo da narrativa constrói-se um diálogo ora irônico, ora respeitosos, com os leitores do romance-blog, que às vezes também são tratados com os piparotes machadianos, como na seguinte passagem-homenagem a Machado de Assis: “À leitora apressadinha do blog que quer dar saltos na história, esclareço que ainda não é o momento de ir tão longe (…)”.[16] Nos seus cinco romances, aliás, Almino tem sempre incorporado com grande criatividade técnicas derivadas do universo audiovisual e digital, compondo um dos mais fecundos diálogos contemporâneos – e não me refiro apenas à literatura brasileira – acerca do lugar ou dos lugares da literatura e do literário.

Vejamos.

A fotografia e o cinema ocupam um papel fundamental em Ideias onde passar o fim do mundo. Uma máquina e, por que não?, uma espécie de processador de textos destacam-se em Samba enredo. A escrita como gesto autobiográfico domina Cinco estações do amor. A fotografia, mais uma vez, fornece a estrutura de O livro das emoções, porém uma fotografia cujas imagens são deliberadamente subtraídas, a fim de aguçar a imaginação do leitor. O leitor afoito talvez não compreenda o alcance do gesto ficcional de João Almino.

Afinal, é como se o centro dinâmico da vida cultural hoje em dia estivesse no cinema, no vídeo, na música pop, enfim, na internet – não mais na literatura. Não surpreenderá então o juízo de Wim Wenders: “Cinema e rock ’n’ roll são, cada vez mais, as duas expressões contemporâneas mais precisas, mais espontâneas. Tenho a impressão de que todas as outras formas de reflexão, sobretudo o teatro ou a literatura, são demasiado lentas, pesadas. O cinema e o rock ’n’ roll são consumidos em harmonia com nossa época de consumo. De uma maneira direta, rápida”.[17]

João Almino, creio, vai além dessa constatação em seus romances. Ora, repetimos sem pensar citações como a de Wenders como se elas não fossem o que de fato são: uma aceitação passiva da circunstância contemporânea, um surpreendente positivismo pós-moderno, como se o fato objetivo do predomínio dos meios audiovisuais e digitais, indispensáveis ao pleno fluxo do funcionamento do capitalismo atual, obrigasse a abraçar acriticamente os objetos da cultura audiovisual e digital, como se a tarefa do intelectual fosse a de justificar a hegemonia do momento. Pelo contrário, a ficção de Almino estimula a seguinte hipótese: a reflexão contemporânea sobre a literatura deve desdobrar as consequências do deslocamento do objeto livro do centro do circuito comunicativo. Posso dizê-lo de forma ainda mais clara: qualquer reflexão contemporânea sobre a literatura deve partir da teorização das consequências da centralidade dos meios audiovisuais e digitais na definição da cultura contemporânea. No século XXI, a literatura e a crítica literária ocupam um papel secundário, periférico mesmo, se comparadas à febre digital e a dominação já longeva dos recursos audiovisuais. Contudo, tanto esse papel secundário quanto o espaço-tempo Brasília podem ser vividos como espaço de liberdade e tempo de livre experimentação. Se não me equivoco, esse é o caminho escolhido pelo escritor João Almino.

Encerro a digressão, um tanto raivosa, reconheço, e retorno a outro eixo do romance Cidade Livre. )

O espaço-tempo representado pela Cidade Livre reconstruída na ficção de João Almino reúne dimensões em tese opostas; reunião cuja sutileza é uma das forças do romance, explicitando a arquitetura de seu ideário estético-literário. Vejamos como essas dimensões se encontram e já que menciono níveis diversos, nos próximos parágrafos transitarei da ficção ao ensaio de Almino, propondo uma espécie de Cidade Livre de suas preocupações.

Começo pela voz do engenheiro: “É como o presidente diz, observou Roberto, esta é a primeira capital construída do zero, num lugar desabitado, sem o apoio de nenhuma aldeia ou povoado”.[18] Encontra-se, nessa observação, a base do credo cartesiano de Max Bense, pois, claro está, nesse panorama desértico cabe à vontade racional o impulso de geometrizar o espaço virgem, na “emancipação da inteligência” que tanto o encantava. Porém, mais ou menos na metade do romance, caberá à profetisa-prostituta, Irís-Lucrécia, ecoar a mesma afirmação, conferindo-lhe, contudo, uma deriva muito diversa, bem próxima, aliás, dos estudos esotéricos de Iara Kern, que há algumas décadas chegou a ocupar bastante espaço na mídia com seu livro De Aknaton a JK.[19]

Escutemos a personagem de João Almino: “Eu quero encontrar o presidente, ele é o faraó egípcio Akhenaton da décima oitava dinastia, afirmou Lucrécia, categórica. JK ia construir não apenas uma cidade, mas uma civilização. O faraó, que governara entre 1353 e 1335 antes de Cristo, havia criado do nada, como em Brasília, a primeira capital planejada, Akhetaton”.[20] A analogia é impecável, especialmente se recordarmos que, e agora cito o ensaísta João Almino, “não falta à história do projeto de Brasília também a dimensão mística. D. Bosco, o santo fundador da ordem dos salesianos, teria tido em 1883 um sonho profético sobre a ‘Terra Prometida’ (…) onde seria fundada ‘uma nova civilização’”.[21]

E, com efeito, o Plano Piloto foi associado pelo próprio Lucio Costa à cruz cristã. Nas palavras do urbanista: “nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal-da-cruz”.[22] Irís Quelemén assinaria embaixo, sem dúvida. E não é tudo: a primeira capela de Brasília, a Ermida Dom Bosco, alude à profecia do santo, e, conforme o pai do narrador JÁ explicou: o presidente “escolhera a data de 3 de maio (para a primeira missa de Brasília) por sua proximidade do aniversário da missa mandada rezar por Pedro Álvares Cabral”.[23]

Não surpreende, portanto, que a própria Cidade Livre, cidade construída para ser destruída, tenha se transformado numa das futuras cidades-satélites que, em alguma medida, comprometem a racionalidade pretendida no Plano Piloto. É que, recorda o ensaísta, “com o tempo descobriu-se o óbvio: não é o plano urbanístico que molda a sociedade, mas esta que vai dando novos significados àquele”.[24] Por isso mesmo, nas palavras do romancista, próximo à conclusão de Cidade Livre, traduz-se o espanto de um jornalista estrangeiro em visita à nova capital: “A razão para o espanto não era a arquitetura de Oscar Niemeyer, nem o plano urbanístico de Lúcio Costa; eram as crenças e seitas que já proliferavam pelos seus arredores e a possibilidade de que Lucrécia, uma prostituta, viesse a ser profetisa”.[25]

A ficção de João Almino, portanto, procura dar forma a esse espanto e, ao fazê-lo, recorda a distinção do engenheiro Roberto entre a engenharia-prosa e a arquitetura-poesia. É como se Cidade Livre fosse a prosa do poema de João Cabral. Por isso, através de seus cinco romances, João Almino nos ajuda a habitar imaginariamente o edifício Brasília, ao mesmo tempo em que sua complexidade pode finalmente nos habitar.

 



[1] Professor de Literatura Comparada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

[2] Trata-se, sem dúvida, de alusão que leva o leitor de João Almino a pensar imediatamente no Machado de Assis de o Memorial de Aires, o M de A. Em outro texto, discuti a importância da obra machadiana na ficção de João Almino. O próprio escritor recentemente publicou um agudo ensaio dedicado à obra de Machado de Assis: O diabrete angélico e o pavão. Enredo e amor possíveis em Brás Cubas. Belo Horizonte: Editora UGMF, 2009.

[3] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 126.

[4] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 18.

[5] Idem, p. 8.

[6] João Cabral de Melo Neto. “Acompanhando Max Bense em sua visita a Brasília, 1961”. Museu de tudo. 1966-1974. Obra completa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994, p. 371.

[7] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 114.

[8] Max Bense. A inteligência brasileira. São Paulo: Cosac Naify, 2009, p. 18.

[9] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 90.

[10] Somente esse aspecto bem pode inspirar outro artigo. Uma abordagem inicial do assunto encontra-se no livro de Dioclécio Luz, Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986.

[11] Max Bense. Op. cit., p. 28.

[12] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 43.

[13] Idem, p. 223.

[14] Idem, p. 16.

[15] Idem, p. 16-17.

[16] Idem, p. 136.

[17] Wim Wenders. “O nome do novo”. Bravo! Entrevistas. São Paulo: D’Avila, 2002, p. 74.

[18] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 72.

[19] Iara Kern. De Aknaton a JK. Das pirâmides a Brasília. Lançado em 1984, o livro conheceu um grande êxito: “O livro já foi traduzido em seis idiomas (inclusive o japonês), gerou um filme, com roteiro da autora e direção de Pedro Torres e uma série de pinturas de Byron de Quevedo (reproduzidas na segunda edição”. Dioclécio Luz. Roteiro mágico de Brasília, Brasília: CODEPLAN, 1986, p. 36.

[20] Idem, p. 131.

[21] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 12.

[22] Idem, p. 15.

[23] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 106.

[24] João Almino. “Brasília, o mito: Anotações para um ideário estético-literário”. Escrita em contraponto. Ensaios literários. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2008, p. 16.

[25] João Almino. Cidade Livre. Rio de Janeiro: Record, 2010, p. 222.